sexta-feira, 18 de maio de 2007

A escola em que nossos filhos não estudam

Certos temas não podem ser esquecidos com facilidade, simplesmente porque colocá-los em arquivos pouco visitados do nosso cérebro seria uma ofensa considerável àqueles que lutam para o mundo continuar girando no ritmo de sempre, sem taquicardia.

É assim, citando algumas, com o caso dos "filhinhos de algo" (fidalgos), de Brasília, que resolveram atear fogo no índio pensando ser mendigo – mendigo dentro de pouco tempo não será gente – por pura "brincadeira" de pessoas que, teoricamente, "pensam" este país; o assassinato do menino João Hélio e a inevitável discussão sobre maioridade penal, falha do sistema judiciário e carcerário, assim como um maior rigor das penas aplicadas; a "síndrome de balas perdidas" no Estado do Rio de Janeiro, a guerra urbana e a estreita ponte entre os incluídos e os excluídos; os dólares na cueca, a compra de favores e a história de uma luta válida manchada por pura prepotência e muita sacanagem; os votos suspeitos para a aprovação da reeleição e, agora, a "aprovação automática" em todos os ciclos do Ensino Fundamental nos colégios municipais do Rio.

Sim, é preciso que se coloque tal medida (portaria) junto às mazelas graves deste país porque o efeito futuro pode ser (e tudo leva a crer) devastador.

Ouve-se muito a palavra "domínio de turma", ou seja, dentro da educação equivale a dizer que o professor sabe controlar a turma impondo sua "autoridade" e entretendo os alunos com sua "bagagem". Ora, professor não é domador para ter "domínio de turma", não é polícia para ser temido por sua "autoridade" e nem é palhaço para entreter os alunos com a sua "bagagem" (exageros meus à parte). Porém, no estado em que se encontra a educação, o professor costuma ser tudo isso, menos educador, seu principal papel.

Quando tudo parece embaçado, tenebroso, obscuro, percebe-se que o poço (essa tal de educação) não possui profundidade, ele é "romanceado", extraído da mente de um Stephen King ou algo que o valha. Quando a água parece salubre, vem o zelador do poço e urina dentro dele, talvez pra ver se escuta algum barulho ou para mostrar ao puxa-saco cotidiano que, como dizem, não há fundo.

Passei uma redação para alunos do Ensino Médio de um colégio particular na Baixada Fluminense sobre o "problema" educação e a polêmica em torno da "aprovação automática" – seja lá o que isso queira dizer. Giselle dos Santos, aluna do segundo ano, escreveu que "o aluno precisa ser avaliado e, no final, provar se merece o prêmio da "aprovação" ou não. Se por acaso, o aluno não for "bom" e continuar passando, o que será dele amanhã?". Concordo, um dia, depois de empurrar muito "com a barriga", encontraremos um muro intransponível, este muro se chama "mundo" – a vida pronta para ensinar as regras verdadeiras e duras da sociedade. Giselle salientou ainda que, mesmo com diploma, este aluno não saberá nada e, descartado do mercado de trabalho, tendo que sustentar família, optará inevitavelmente para o roubo, pois empregos não são dados de "mão beijada ".

Outro aluno, Bruno, estudante do primeiro ano, pergunta se não pensaram na motivação (ou a falta dela) dos alunos que realmente se interessam. Será que tal atitude não despertaria o rancor daqueles que dão duro nos deveres e estudam de fato? Este é outra carta neste jogo perigoso. Deveríamos estar jogando com a educação? Talvez não.

Para a estudante Adriana Ferreira, outra aluna do segundo ano, a palavra "aprovação" significa demonstração por atos, palavras ou gestos, de que se concorda com algo; concordância. O que Adriana quer dizer com o Aurélio em mãos é: como a "aprovação automática" se encaixa no sistema educacional? Como "fazer" educação de verdade se, ao invés de concordância, estamos caminhando para o aparthaid?
Deus não joga dados, nós também deveríamos "não fazer" o mesmo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Quando tecnocratas e teóricos da educação completamente desconectados da realidade inventam essas políticas, tais como "progressão continuada" e quejandas, esquecem (convenientemente, aliás) que professores, são antes de tudo PROFISSIONAIS DO ENSINO, e não assistentes sociais, animadores de torcida ou comandantes de tropas.

Pior que isso: esses tecnocratas acham que "inventam a roda" com inovações que, no fundo, estão completamente em desacordo com o atual estágio do capitalismo predatório que vivemos. Triste e desalentador. Por essas e outras é que tenho pensado muito em não voltar para a sala de aula.

Continue levantando esses temas, Marcelo. Esse debate não pode ficar somente na mão dos gabinetes das Secretarias de Educação. Um abraço e parabéns pelo texto lúcido e corajoso.