sábado, 25 de abril de 2009

Há luz?

Está na revista Veja (8 de abril de 2009), pág. 61: “Foi tão divertido! O lugar é tão relaxante, tão calmo e bonito.” A frase em questão foi vomitada pela mais recente Miss Universo, a venezuelana Dayana Mendoza, e refere-se à prisão americana em Guantánamo.

            Até onde pode chegar a “brutalidade intelectual” das pessoas é um enigma, contudo, desde que existente no mais remoto cu-do-mundo, ninguém se importa, mas quando uma aberração assim é lançada do limbo da mediocridade direto para os holofotes perversos (e igualmente medíocres) da mídia, a coisa muda drasticamente de figura. Muda porque invade os nossos lares e faz-nos pensar (ou não): este será o legado da futura geração (meus filhos!)?

            A Miss Universo, ou seja lá o que isso queira dizer, não me interessa, mas preocupa-me os imensos exemplos de cabeças de camarão que andam por aí ganhando muito dinheiro sem profissão alguma, sem um talento que possa justificar tamanha exposição e influenciando milhares de jovens “barbies” sem qualquer ponto de referência. Profissão: famoso.

            Nós, adultos há algum tempo, com nossas ideologias, partidos políticos e crenças, crescemos com coisas palpáveis e inerentes à inteligência, tanto na música quanto na política, havia uma estrela consistente: Artur da Távola, Chico Buarque, Renato Russo, Darcy Ribeiro, Brizola, M. Gabriela, Veríssimo, Fausto Wolff, Barbosa Lima Sobrinho, Zuenir, Roberto D’Ávila, Alberto Dines, Fritz Utzeri, etc. Podemos discordar do partido, dos artistas, do show busines, mas podemos dizer que falta(va) cérebro nestas pessoas? E hoje, o que há?

            Você já foi bagunceiro na escola? Eu era extremamente bagunceiro, mas isso ultrapassava os limites do respeito ao próximo, ao educador ou à instituição? Pois é. Isto não é problema social, problemas sócio-econômicos, escravização, mídia golpista, humilhação, neste país, sempre existiram, no entanto, degradação generalizada e ausência de referências é a primeira vez.

            Há luz no fim da merda? Não a vejo. Mas, por favor, contradigam-me! Ou reflitam sobre o Haiti ser aqui.

            

sábado, 18 de abril de 2009

Educação de sucata: objetivo do Eduardo

.
.
O projeto de Lei nº 2/2009, do prefeito Eduardo Paes, que repassa para ONGs a responsabilidade de gerir os recursos, equipamentos, prédios e pessoal da administração pública, já está na Câmara de Vereadores para ser votado. Para o Sepe e demais entidades do funcionalismo municipal a aprovação do projeto é a privatização pura e simples do serviço público municipal, que poderá piorar a já grave situação da educação pública na cidade do Rio de Janeiro.
.
Entenda melhor o que significa o projeto:
1) O secretário chefe da Casa Civil, Pedro Paulo Carvalho, afirmou em entrevista à Rádio CBN, no dia 07/4, que o governo não sabe o que vai acontecer com os servidores que trabalham nos setores da administração municipal que serão repassados para a gestão das Organizações Sociais. Também não explicou como serão escolhidas as organizações, dizendo apenas que elas terão que prestar contas trimestrais, através de relatório de avaliação e metas a cumprir.
2) O projeto vem ao encontro da política pedagógica que a secretária de Educação, Cláudia Costin, vem implementado na rede municipal e que se baseia no programa já utilizado pelo governo do estado de São Paulo: criação de gratificações a partir da produtividade e dos resultados das escolas. A rede estadual já conhece bem tal programa, já que o governo Garotinho, desde o final do seu primeiro ano de mandato introduziu sob a forma do Programa Nova Escola e que até hoje gera controvérsias e rejeição na categoria.
3) O projeto de Eduardo Paes só vem confirma o descaso com a valorização do ensino público municipal e para com a autonomia pedagógica das escolas. Ao invés de reajustar os salários (muitas rede de municípios com arrecadações menores que a do Rio tem piso superior ao da rede municipal) quer promover a entrega das escolas públicas para organizações do setor privado.
4) As avaliações dos alunos promovidas este ano pela SME comprovam o compromisso da atual gestão para com entidades educacionais do setor privado, como a Fundação Ayrton Senna e a Fundação Roberto Marinho. As provas, elaboradas a toque de caixa por tais entidades – sem que a SME revelasse o valor de tais convênios - continham erros grosseiros de conteúdo, que foram denunciados pela categoria e pelo Sepe na Imprensa. Que melhoria da qualidade do ensino é esta, senhora secretária?
5) A autonomia pedagógica é um dos pilares para a garantia da escola pública com bases democráticas e que assegure o repasse do conhecimento para os alunos, possibilitando que estes possam ingressar como atores do seu próprio destino na sociedade contemporânea.
6) O sistema de bônus, idealizado pela SME ataca um dos pilares básicos do plano de carreira da educação municipal proposto pelo Sepe e pela categoria e até hoje não implementado: a progressão por tempo de serviço e de formação. Na rede estadual do Rio, o Programa Nova Escola, que também tomava por base a gratificação a partir da avaliação individual das escolas, promoveu a quebra da paridade entre profissionais da ativa e, também para os profissionais aposentados. Os ativos, tem gratificações diferenciadas (e milhares ainda estão de fora das gratificações). Os aposentados, também ficaram de fora e recebem menos que os profissionais que recebem o Nova Escola.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Professor Halem




.


"Condenado ao verso

como um fiscal da lida

impeço que a vida passe

como se pudesse não ser percebida."

Elisa Lucinda, em Poeminha dos olhos

.

O poeta Geraldo Carneiro, a respeito de Elisa Lucinda, escreveu que ela é uma "espécie de Adélia Prado com sexo, drogas e rock'n'roll".

.

De fato, entre as duas escritoras há pontos de contato, ainda que uma delas crie seus versos na sua pacata casa em Divinópolis, e a outra o faça, na maioria das vezes, no Rio de Janeiro. Adélia Prado, ao falar das comadres que se visitam e das brincadeiras e encontros nos quintais, quer que esse cotidiano, aparentemente simples, mostre-se ao leitor de outro modo que só se torna visível graças à iluminação da poesia. Elisa Lucinda* às vezes faz o mesmo, mas agora dentro do ritmo agitado de uma metrópole superpovoada. Sinal dessa proximidade pode ser encontrado no poema Entre Vista (ou aquilo que ainda não me perguntaram), em que encontramos este verso:

.

"- que não gosto de ler Adélia Prado porque alguém em mim fica doido para copiá-la e eu, por isso, imediatamente o desprezo".

.

Num outro poema (Termos da nova dramática), Lucinda pede: "Parem de falar mal da rotina" e defende os "óbvios de estimação" para arrematar:

.

"O enredo

a gente sempre todo dia tece

o destino aí, acontece

o bem e o mal

tudo depende de mim

sujeito determinado da oração principal"

.

E o que se tece no dia a dia dessa poeta? No poema Tinha uma rima no meio da moqueca, ao falar de seus vários "eus", ela escreve que "mistura as cuecas do filho/ às ' Flores do Mal ' de Baudelaire." Em Cortando Cebola, ela assim se vê:

.

"Eu que era artista sem dinheiro, aquela

E o talento esburrando como leite

esquecido exagerado de fervido

Eu era o amigo de meu próprio peito

que estava quase abandonado a causa

Minha alma picadinha junto ao coentro

esquartejava meu anjo de guarda

como quem desossa uma galinha

sozinha, chorando sobre a solidão das vasilhas

tão melhor do que a minha"

.

Essa poesia "despojada", sem pose, é saudável, numa época em que ou se tem publicado versos talhados com marreta, sem nenhuma cadência e ritmo, ou cheios de "estilismo" e vanguardice, incompreensíveis, chatos ou simplesmente pueris, que afastam e entediam os leitores.

.

* Os poemas citados nesta postagem estão nos livros O semelhante e Euteamo e suas estreias, ambos publicados pela Editora Record.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Quatro anos da maior Chacina do Rio

Relembre o caso.

Por: Raphael Bittencourt e Dione Barbosa

Jornal ComCausa - Cultura de Direitos

No dia 30 de março de 2005, noite de quarta-feira, policiais decapitaram duas pessoas e atiraram a cabeça de uma delas para dentro do 15º Batalhão da Polícia Militar em Duque de Caxias. As cenas foram registradas pelo sistema de segurança de uma escola ao lado do Batalhão.


A ação seria uma resposta ao comando da polícia pela “operação Navalha na Carne”, que colocou sob detenção mais de uma centena de policiais e levou vários outros a prisão por desvio de conduta.

Na noite seguinte, 31 de março, policiais iniciaram uma seqüência de mortes em Nova Iguaçu e terminaram em Queimados. O resultado foi 29 mortos, sendo, oito crianças.

Foi a maior chacina do Rio, chocou o Brasil e ganhou o noticiário internacional.

Na tarde de 31 de março de 2005, segundo investigações, por volta das 04 horas, os policiais Marcos Siqueira Costa, José Augusto Moreira Felipe, Carlos Jorge Carvalho, Júlio César Amaral de Paula passaram horas bebendo no bar Aza Branca, na Rua Dom Valmor, no centro de Nova Iguaçu. Na frente do bar um gol prata estava parado com as portas abertas. Junto com eles estava Fabiano Gonçalves Lopes, que teria saído do local pouco depois das 20 horas, quando o grupo entrou no carro e seguiu até o acesso da Via Dutra – sentido São Paulo - no bairro Esplanada.

Rafael da Silva Couto e o seu amigo William Pereira dos Santos foram as primeiras vítimas. Os rapazes foram assassinados quando voltavam de bicicleta do trabalho para casa, às 20h35 no acesso para o bairro da Posse.

Os assassinos seguiram pela Rua Gonçalves Dias e entraram na Avenida São Paulo, onde mataram mais duas pessoas por volta de 20h40: Luiz Carlos da Silva; e José Carlos de Oliveira, que passava pelo local no momento em que os tiros foram disparados.

Retornaram à via Dutra, cruzaram o viaduto da Posse e, pouco antes das 20h50, assassinaram Alessandro Vieira.

Entraram em uma rua transversal que dá acesso à Rua Gama onde, na altura da Escola de Samba Flor do Iguaçu - no bar Caíque - por volta das 21h balearam dez pessoas, matando nove. No local foi alvejada a comerciante Elizabeth Soares Oliveira; o adolescente e deficiente auditivo Felipe Carlos Soares de Oliveira; Bruno da Silva Souza; o biscateiro Jonas de Lima Silva; o funcionário público Robson Albino; Manoel Domingos Lima Pereira; Jaílton Vieira - que era vizinho ao bar e tinha ido pagar uma dívida de R$ 2,00; o segurança José Augusto Pereira da Silva e o senhor Maurício - cunhado de Caíque, dono do bar; Douglas Brasil de Paula, estudante, que trabalhava em uma padaria da localidade para ajudar a família; e Kênia Modesto Dias esposa de Caíque. Douglas e Kênia chegaram a ser socorridos, mas morreram no hospital.

Perto das 21h15, os assassinos passaram pelo centro comercial do bairro Cerâmica e na Rua Geni Saraiva, mataram mais duas pessoas: Leonardo da Silva Moreira, que havia ido encontrar-se com a namorada no portão de casa, e o padeiro César de Souza Penha de 30 anos.

Voltaram para a Via Dutra e seguiram até o município de Queimados.

As 21h15, na Rua Vereador Marinho Hermetério Oliveira, em frente à Mania Lava Jato, foram mortos o dono do estabelecimento Luís Jorge Barbosa Rodrigues; Wagner Oliveira da Silva; Márcio Joaquim Martins e o estudante e ladrilheiro Fábio Vasconcelos.

Eram quase 21h30m, quando os criminosos seguiram para o Campo da Banha, onde atacaram cinco pessoas que estavam num bar: os estudantes Marcelo Júlio Gomes do Nascimento e Marcus Vinícius Cipriano Andrade; o segurança Francisco José da Silva Neto; o padeiro Marco Aurélio Alves, e João da Costa Magalhães, que estava sentado na porta de casa.

Tudo indica que a maioria das vítimas foi escolhida aleatoriamente. Em alguns pontos, os assassinos simplesmente passaram atirando.

As vítimas receberam

96 tiros - algumas foram baleadas 13 vezes.

Muitas receberam tiros na nuca e no rosto para se certificarem de que morreriam.

Em maio de 2005, o Ministério Público denunciou onze envolvidos. Entretanto, em fevereiro de 2006, a juíza da 4ª Vara Criminal de Nova Iguaçu - Elizabeth Louro - admitiu parcialmente a denúncia e pronunciou apenas cinco. Segundo a justiça, somente contra estes foram encontrados indícios suficientes para levá-los ao Tribunal de Júri. Outros quatro foram inocentados e dois foram acusados apenas pelo crime de formação de quadrilha. O cabo Ivonei de Souza, entrou com recurso contra a decisão, e o cabo Gilmar Simão - que negociava a ‘delação premiada’ - foi assassinado em outubro de 2006, quando ia prestar depoimento na 4ª Delegacia de Polícia Judiciária Militar.

Em agosto de 2005 o soldado PM Carlos Jorge foi julgado e condenado a 543 anos de prisão.

No final de novembro de 2006, o cabo Siqueira, outro acusado, levou oito facadas na barriga e no peito, dentro da própria cela, no Batalhão Especial Prisional. Marcos ia depor no dia seguinte e, assim como Gilmar, estava negociando a “delação premiada”. José Felipe e Carlos Carvalho são suspeitos de serem os autores da tentativa de assassinato.

Em dezembro de 2007, José Augusto Moreira Felipe foi condenado a 542 anos de prisão em regime fechado. Já no dia 12 de março de 2008, Fabiano Gonçalves Lopes foi absolvido das acusações de homicídio e condenado a sete anos de prisão por formação de quadrilha. O júri acatou a tese da defesa, que alegou falta de provas. O próprio Ministério Público retirou a acusação de homicídio e manteve apenas a de formação de quadrilha.

Outros acusados, Júlio César Amaral de Paula e Marcos Siqueira Costa, foram pronunciados, mas ainda não há data para serem levados a júri popular.

Todos os julgados foram expulsos da Polícia Militar.

“A violência não acaba no ato do assassinato”

Ao analisar todos os casos desta e de outras chacinas, Adriano Dias, da ComCausa, chega à conclusão de que a violência não acaba no ato do assassinato. “As conseqüências da perda estendem-se para muito além do episódio em si. Por conta disso é necessário criar programas para as vítimas dessa e de outras violências” - e completa - “A manifestação por justiça é importante, mas a atenção amorosa, a acolhida é muito importante para ajudar a superar o trauma.”


__________________________________________________

OBS.: Meus caros senhores, agora, a Loba resolveu dar um tempo, deixando-nos sem a sua escrita (que é o mesmo que dizer que ficaremos sem o pulsar do seu coração). Outro protesto apresento!