As formas não me querem dizer muita coisa. Caminho pelo calçadão à noite, estou dentro da fileira de camelôs e eles não me mostram nada, estou no meio dos carros parados em frente às lojas fechadas e eles não me buzinam nada; os semáforos, a música no rádio comprado no Paraguai ligado clandestinamente no poste público não me toca nada. O tempo não me fornece um antídoto, os sinais na rua não me abrem nada. O tempo... se é que ele existe, manifesta-se em finas camadas esparsas, como gotículas d’água em frigideira quente, só se faz presente em meus passos, nas barracas que se afastam e reluzem. Estou preso a este espaço contínuo de um mundo novo a contra-gotas, estou cercado de coisa nenhuma, mas continuo vivo. O mundo mostra-se de maneira estúpida e acho-me estúpido. Sou eu e mais nada. O cheiro de óleo queimado proveniente da carroça de frituras deixa-me enjoado, a visão das pessoas comendo seus respectivos cachorros-quentes mareiam-me. Estou pisando nas lamentações que se esconderam na sarjeta e isso me causa uma sensação diferente de frio, apesar de ser primavera no Rio de Janeiro. Não sinto a graça da noite, mas o cansaço das paredes; não sinto a riqueza dos edifícios, mas a poeira úmida dos portões. O nada, agora, toca-me, presencio a sua grandeza, reconheço o seu alicerce, ele é a maior coisa que eu já experimentei. Ele é enorme, é infinito. Tento me sentar, o nada tomou conta de mim. Do nada, nada pode provir, porém, eu sou algo e de mim pode-se provir tudo, pois eu sou átomo. Sou todo nada, compreendo o seu enredo, entendo a areia em meus pés, deslizo pela sua essência e ela é neutra. Onde estou? O silêncio é arrebatador, explosões à minha volta, conglomerados, matérias sólidas, gasosas estão por toda parte, e, neste momento, sinto a presença do Todo e da descoberta do mundo.
2 comentários:
Marcelo, adorei esse texto, cara, adorei mesmo! Pode ser maluquice minha mas me lembrou algo de iluminação, esse vazio, esse nada... Gostei muito!
Olha, não apareci antes porque tô sem net em casa.
Beijão.
Obrigado mesmo, Sandra, sinto-me feliz com críticas positivas vindas de quem faz blog como você! Tentei (e devo sublinhar que apenas tentei) fazer algo como Eloísa Seixas ou Clarice Lispector, entrando no tema da redenção, da iluminação que arrebata, algo assim.
Abraço forte!
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