quinta-feira, 31 de maio de 2007

Pirata Z

Gente, para quem gosta de uma boa história, faz-se absolutamente necessário uma visita ao blog do Pirata (http://www.zinedopirata.blogspot.com/) . Leiam tudo sobre o "Diário de bordo - resistência". Todos os dias um novo capítulo (bem escrito e fascinante) sobre o melancólico e covarde fechamento de uma rádio comunitária, o nascimento de um zine e a luta dos seus "resistentes". Simplesmente essencial! Vale a conferida.

terça-feira, 29 de maio de 2007

O homem e o artista

Lendo o blog do professor Halem Souza (Quelemém), sobre Drummond (http://racaodasletras.blogspot.com/) e o quanto temos, enquanto acadêmicos (ou pseudo-intelectuais?), aversão aos “monstros”, “gigantes sagrados” da nossa (boa) literatura simplesmente porque são ovacionados por crítica (muita) e público (idem); a idéia de compartilhar escritores, músicos e afins com muita gente soa, por essas bandas tupiniquins, meio “brega”, “João-vai-com-as-outras”, teleguiado, entre outras boçalidades do gênero.

Outra coisa que impressiona é a dificuldade que temos em separar o artista do homem que mora dentro do artista, do homem “que trabalha o poema com o suor do seu rosto”, àquele “que tem fome como qualquer outro homem”.

O professor Halem mencionou Caetano Veloso em seu texto como alguém considerado ultrapassado apesar de continuar escrevendo lindamente e de já ser consagrado internacionalmente por obras “monumentais” dentro da sociologia brasileira. Caetano assim o é considerado porque é retratado como “monstro” por nove entre dez entrevistados, isso causa certo desconforto para quem precisa “urgentemente” se destacar dentro do “cenário academicista” ou para que seus exemplos adquiram certa relevância ao invés de ser considerado um exemplo “mais-do-mesmo”.

Tais distorções também são uma constante quando ligamos o artista ao seu universo puramente pessoal e, portanto, teoricamente desinteressante. Muitos acham Chico Buarque mais músico que Caetano porque a “pessoa” Francisco Buarque é mais simpático e discreto. Caetano já é “meio egocêntrico, sempre quer um palco”. Ora, se separamos artistas baseado em suas vidas pessoais, não podemos sequer escutar tais baluartes – suas obras são pesadas demais para mentes tão pequenas. Já ouvi falar que Pelé nunca foi um bom jogador porque ele como pessoa... Ora, dizer que Roberto Carlos não é um fenômeno pop porque derrapa feio quando censura a Liberdade de Expressão é tentar materializar Papai Noel sem nem saber quem é ou o que significa o bom velhinho. Aliás, Caetano é antipático?

Sabemos que a mídia hoje se preocupa muito com o que não deveria virar sequer notícia de rodapé, a pessoa Renato Manfredini é tão interessante quanto Renato Russo? O fato do homem ser homossexual reflete nas minhas escolhas? Se ele for gay não o escuto de jeito nenhum? Se ela for lésbica eu não compro o ingresso do seu show? Para onde estamos caminhando?

Fechemos as revistas que não saibam quem foi Drummond!

sábado, 26 de maio de 2007

Pérolas que só o Mont garimpa

As duas fotos em questão sairam esta semana no jornal eletrônico Montbläat (www.montblaat.com.br). Duas comédias em níveis diferentes. Uma diz respeito a falta de senso, outra, a falta de educação (aprovação automática?).




O papiro

Não havia fila, não havia barulho, não havia ansiedade. Ele apenas escolheu continuar, sem pressões, perturbações, sermões. Apenas decidiu que já era hora de voltar. Passou algum tempo refletindo sobre ele próprio, pôde ver os erros claramente, os caminhos, os atos; teve um tempo para isso, se é que existiu, de fato, o tempo propriamente dito. Teve a oportunidade de trabalhar também. Trabalhar a ele mesmo, os rumos, a melhor maneira de se atingir os objetivos. “Pré-definiu-se”. Estudou com afinco o meio mais eficaz, lúdico, sensato. Olhou o seu papiro. Todos os itens que não estavam sublinhados eram dívidas a pagar, missão a cumprir, dever de casa não feito, ignorado, adiado, odiado, rejeitado e que, agora, precisava concluir. A lista era imensa, mas em seus olhos não havia nenhum sinal de preocupação ou revolta; seus olhos eram plácidos, de uma contagiante felicidade e paz, iluminado por uma energia arrebatadora e (paradoxo?) tranqüilizadora. Passou a vista em cada item, refletiu um pouco sobre cada um dos não-sublinhados. Levantou a cabeça e fez longas respirações, pausadas, relaxantes; era chegada a hora e estava tudo pronto para a grande viagem. Melhor: ele estava pronto. Certamente que não seria dessa vez que realizaria todos os deveres, não seria nessa viagem que regressaria com todas as respostas resolvidas ou compreendidas, mas isso não o constrangia ou desestimulava. Na verdade, o que queria mesmo era ter um bom desempenho, uma chance justa para cumprir, não todas, mas algumas tarefas da melhor maneira possível a fim de regressar logo para a sua casa. A verdadeira casa. Enrolou o papiro calmamente, carinhosamente. A sensação da brisa em seu rosto era o sinal que estava esperando, fora dado a ele o passe, a permissão. Fechou os olhos, respirou pausadamente outra vez, prolongadamente e, de repente, tudo o que sentiu foi muita dor e uma sensação de desconforto enorme ao mesmo tempo em que se sentia (paradoxo?) em êxtase, entorpecido. E, de repente, esqueceu-se de tudo... Começou a chorar – fora instigado a isso. Não havia mais estado em nenhum outro lugar. O papiro estava dentro dele agora, na sua consciência e em seu coração.

Faca de lados iguais

Duas polêmicas rondam o texto como nuvens que ameaçam chuva, mas, no fim, mostraram-se ser brisas reflexivas, sequer um chuvisco para agradar aos jornais (jornais?).

O ministro da saúde diz que o grande sambista Zeca Pagodinho é patético – apontava, na verdade, para o mal que artistas do seu quilate fazem ao propagar o consumo de bebidas alcoólicas. Foi taxado de tudo (poupou-se a mãe), menos de coerente com o cargo que ocupa. A um ministro da saúde cabe tal declaração, sim, claro que com tons menos brutos – o Brasil, apesar da corrupção e do “jeitinho”, é um país sensível a tais concordâncias nominais e verbais. Deveria ter ele, o ministro, palavras mais sutis para dizer o quanto não precisamos de alguém fazendo campanha em prol do alcoolismo. Sinto-me a vontade para falar de tal “polêmica”, pois adoro uma cerveja/chope acompanhado de uma música ao violão. Ao ministro cabe tudo que seja relacionado à saúde deste país, inclusive fazer campanha contra as propagandas que circulam em apologia a qualquer bebida alcoólica. Dizer que ele deveria se concentrar em melhorar os hospitais e afins sem “mexer com quem tá quieto” é reclamar que o policial está lhe revistando quando deveria estar prendendo os “verdadeiros” bandidos.

Clodovil vai ao congresso declarar tudo o que está errado com a moral e os costumes femininos. Certamente, diante da pouca ou nenhuma sutileza e coerência que possui, vomitou o que não devia (mesmo) e foi extremamente mal interpretado no momento único em que foi lúcido. Mas quem acha que as coisas estão em seu devido lugar quando falamos de dignidade e moral levante o dedo (mindinho se quiser). A geração de hoje anda perdendo um pouco o pudor e a trava que aprendíamos a ter com nossos pais antigamente. Tudo se reduz a ter ou não dinheiro. As pessoas vendem o corpo, a alma, a dignidade em troca de estabilidade, de sucesso vão, de quaisquer “Bundas” que apareça por aí. Pode parecer inofensivo agora, mas daqui a pouco ficará incontrolável. Temo pela minha filha de um ano. Que valores devo incutir? Os de sempre. Mas isso vai contrastar com a nova norma dos “tempos modernos”? Eis a questão. Estou preocupado, aflito até. Deveríamos refletir sobre os valores dilacerados da família, sem religiões, dogmas ou estereótipos. Mas se não conseguirmos, que a discutamos sob qualquer aspecto. É necessário.

Requião e Clodovil, vilões para a mídia? Certamente serão sempre. Um porque está no cargo mais ingrato do mundo, assim como o goleiro de futebol; o outro porque ainda não mostrou a que veio e, talvez, jamais mostrará – seu currículo fala por si. Porém, ambos levantaram questões e não foram questões tão supérfluas assim.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

O enigma Clarice

O texto que vocês estão prestes a ler foi extraído do blog: http://paisagensnajanela.zip.net/ da escritora Denise. Vale a pena uma conferida, tenho certeza de que a paz dos textos vivos e bem escritos são antídotos válidos no mundo de hoje. Boa leitura!

Eu não sei se acontece com todo mundo, mas tem dias que queria algo bem pronto e fico com medo da aventura que é ler Clarice. Já comecei um texto sobre seus textos para jornal acho que dezenas de vezes e sempre paro na última linha me perguntando onde isso vai dar. Já terminei outros e fico com a sensação de não, e ainda não. Tenho a impressão que não vou a lugar nenhum e fico paralisada, mais múmia impossível. Clarice é minha esfinge. Eu a consulto todos os dias. Clarice é meu enigma e eu a leio todos os dias só para ver as linhas se cruzarem. Quando tudo parece fazer sentido, a coisa me escapa. Quando penso que a peguei, ela diz que não. O que faço com Clarice? Um dia, qualquer dia desses, lhe prego uma peça, e bem merecida, porque Clarice vive me pregando peça, me dando no pega, me danando. Que mania é essa de escrever nas entrelinhas! Olha, Clarice, está bem, vamos fazer um pacto: eu entro com a pergunta, você com a resposta. E chega de charadas. Está bem, lógico que você tem razão e que no meio da zoeira, eu me divirto. Nem zoeira é. Eu sou tonta e burra como porta. Porta tem função. Literatura também tem? Eu faço a pergunta e você responde, mas chega de charada. É claro que Clarice é o meu fantasma, de madrugada, enquanto todos dormem, lá está Clarice a rondar meus sonhos, a me perguntar porque eu disse aquilo e aquilo outro e a desviar meu caminho, a dizer que isso é uma asneira, que mais vale um cachorro morto. E o que eu faço nas manhãs de cólera de Clarice? E quando a ira de Deus a toma, Meu Deus! Eu tenho medo de Clarice quando ela está irada. Clarice não é boazinha e nem gosta de gente boazinha. Ela também não perdoa, mas tem um grande amor dentro de si. O que a gente faz com gente que nasce imbuído de tanto amor, mas de tão grande amor que a gente sente a ferida exposta? Clarice é um cavalo solto e livre. Ela é peixe também, porque Clarice vive devindo animal na alma da gente. E ela tem um espírito que é leve, doce, mas tão leve que de pluma nada tem. Ela não é gato. Acho que é leopardo. Não. Ela é pássaro. O que a gente faz com pássaro? Deixa voar. Acho que só tem um jeito de ler Clarice: entrando dentro do quadro. Olhando as cores. Observando as linhas que se cruzam. E não é assim, com essa redoma no entorno, que consigo ler Clarice. Não se pode aprisionar Clarice. Ela entra em linha de fuga. É. Porque tem uma redoma que se chama método ou algo que o valha que se arrebenta quando se lê Clarice. É porque Clarice só se permite o vôo livre. Eu, na rasante, fico pensando que não se leva Clarice no bico. Ela entorta o bico e te bica. Clarice é assim. Ela é o fundo no raso. Ah, e então, vem Deleuze. Parece que uma coisa cola na outra. O Carlos Mendes já disse isso. Clarice e Deleuze parecem irmão gêmeos, um adivinhando o pensamento do outro. O meu enigma é a esfinge. Clarice é. E eu? No só. Já se disse que Clarice é uma estrela? Tudo já se disse sobre Clarice. Nada se disse. Sua luz irradia no longe, longe, mas Clarice já está dentro do nada mais puro. É que no nada - lá está Clarice -, no fundo, lá na origem, criando no Cosmo. O que se faz com estrelas? Cada estrela cadente que rasga o céu me lembra Clarice. E eu faço uma prece para que a esfinge me devolva o fio de voz. Quero uma espada, com lâmina secreta e muita magia, para desvendar a palavra cortante de Clarice.

Peter Pan?

Ainda não compreendo bem como nos sentimos ofendidos quando alguém diz que não temos condições de sediar olimpíadas, copas do mundo ou jogos de dominó na praça da esquina. Talvez o que a comissão não queira dizer abertamente é que não somos incompetentes ou brutos, mas corruptos ao ponto de estragarmos qualquer festa, qualquer mesmo.

Os jogos Pan-Americanos estão sendo discutidos e traçados há pelo menos quatro anos, no entanto, algumas obras só ficarão prontas no final dos jogos (?). O valor estimado e o valor real de suas obras são de um contraste descomunal; até entendo quando o ministro dos esportes vai a um programa televisivo explicar que, quando se formou o projeto, muita coisa não tinha sido levada em conta e, por isso, as contas reais estavam avançando com tanto entusiasmo; mas não consigo, com minha mente limitada, entender como a conta real pode se distanciar tanto do orçamento primitivo. Ou as pessoas envolvidas no projeto não entendiam nada sobre compras e contabilidade (neste país muito se faz assim: se você é partidário e a favor do Chefe, será nomeado para alguma secretaria de assuntos surreais da qual você nada entende), ou... (respondam vocês, já lavei minhas mãos).

A questão que gostaria de levantar é a seguinte: com tanto dinheiro sendo “jogado” no Pan (estadual, federal, não importa, o dinheiro é sempre o nosso), será que jamais sobrará um pouquinho para melhorarmos os índices de violência no Estado? Não sobra nem um tiquinho para o aparelhamento e reciclagem da polícia? Talvez seja a hora de repensarmos se queremos competir (no Pan) na categoria tiro à distância: afinal, nossos projéteis só acham os alvos errados.

Querem apostar como o policiamento será de uma competência linda nos dias dos jogos? Querem apostar como, terminados os jogos, tudo voltará ao normal (normal? Desculpe), com todas as balas perdidas achando todos os alvos errados possíveis?

Em quanto está o orçamento das obras mesmo? Alguém poderia me dizer algo sobre responsabilidade fiscal ou algo que o valha? A tal lei não pode se aplicar a isso? Por quê?

Começo a entender a “aprovação automática” nos colégios municipais: para o mundo externo, nosso país não possui analfabetos, para o interno, ninguém sabe votar.

segunda-feira, 21 de maio de 2007

A descoberta do mundo

As formas não me querem dizer muita coisa. Caminho pelo calçadão à noite, estou dentro da fileira de camelôs e eles não me mostram nada, estou no meio dos carros parados em frente às lojas fechadas e eles não me buzinam nada; os semáforos, a música no rádio comprado no Paraguai ligado clandestinamente no poste público não me toca nada. O tempo não me fornece um antídoto, os sinais na rua não me abrem nada. O tempo... se é que ele existe, manifesta-se em finas camadas esparsas, como gotículas d’água em frigideira quente, só se faz presente em meus passos, nas barracas que se afastam e reluzem. Estou preso a este espaço contínuo de um mundo novo a contra-gotas, estou cercado de coisa nenhuma, mas continuo vivo. O mundo mostra-se de maneira estúpida e acho-me estúpido. Sou eu e mais nada. O cheiro de óleo queimado proveniente da carroça de frituras deixa-me enjoado, a visão das pessoas comendo seus respectivos cachorros-quentes mareiam-me. Estou pisando nas lamentações que se esconderam na sarjeta e isso me causa uma sensação diferente de frio, apesar de ser primavera no Rio de Janeiro. Não sinto a graça da noite, mas o cansaço das paredes; não sinto a riqueza dos edifícios, mas a poeira úmida dos portões. O nada, agora, toca-me, presencio a sua grandeza, reconheço o seu alicerce, ele é a maior coisa que eu já experimentei. Ele é enorme, é infinito. Tento me sentar, o nada tomou conta de mim. Do nada, nada pode provir, porém, eu sou algo e de mim pode-se provir tudo, pois eu sou átomo. Sou todo nada, compreendo o seu enredo, entendo a areia em meus pés, deslizo pela sua essência e ela é neutra. Onde estou? O silêncio é arrebatador, explosões à minha volta, conglomerados, matérias sólidas, gasosas estão por toda parte, e, neste momento, sinto a presença do Todo e da descoberta do mundo.

sábado, 19 de maio de 2007

A função dos anjos

Reproduzo na íntegra um texto simplesmente espetacular, escrito pelo grande Fausto Wolff, no Jornal do Brasil. Textos dessa magnitude não podem ficar no limbo das "edições anteriores" de um jornal. Espero que ele possa fazer, assim como fez comigo, do possível leitor virtual uma pessoa melhor.
E como dizia um bom jornalista: "Boa noite e boa sorte".
A função dos anjos

Fausto Wolff


No mito de Sisifo, Camus expõe a essência da sua filosofia: "O homem morre e não é feliz." Antonio Cândido diz que só há uma verdade absoluta: "Somos todos filhos do medo". Creio que, no projeto harmônico que é a vida, arquitetura perfeita que todo o intelectual tenta deslindar desde Homero, a idéia era, segundo o mito, fazer o homem vencer o medo e a morte através da sabedoria e da criação. Finalmente, através da solidariedade, transformar-se em Deus utilizando toda a sua capacidade energética, momento em que não só seria parte do Universo como seria o próprio Universo.
Aparentemente, não há o que temer neste mundo maravilhoso que recebemos de presente. Ele tem tudo o que necessitamos para ser permanentemente felizes. Somente um coqueiro nos dá casa, comida, bebida, roupa e sombra. Entretanto nascemos chorando inter faeces et urina. O mundo nos apavora tanto que muitos de nós - os autistas, por exemplo - preferem não participar. O homem passa a vida sofrendo entre o drama e a tragédia. A comédia está presente tanto num como no outro. Por que somos filhos do medo se nascemos no Paraíso? É que no Paraíso, como nos bosques de Grimm, existe um lobo feroz, o homem, o bicho que trocou a cordialidade pela ganância e o amor pelo lucro material; o homem que moldou seu destino; o homem que destruirá o mundo.
A solidariedade é uma coisa que pode ser aprendida e faz bem ao corpo e à alma. Outro dia, comprei dez pastéis na padaria. Exagerei na fome e distribuí os oito restantes aos porteiros. Não foi caridade e nem eles precisavam. Todas as vezes em que faço isso, descubro no outro, no olhar do outro o que ele descobre em mim, aquilo que o homem esconde: o verdadeiro ser cordial. Sempre. Minha mulher sempre sai com algumas moedas na bolsa para dar aos os meninos de rua. Também já descobriu que eles se lixam para os cinco, dez centavos. Querem um sorriso, uma palavra gentil, algo que os faça se sentirem também filhos de Deus, feitos à sua imagem e semelhança.
Quarta-feira, dia 7 de fevereiro, morreram assassinadas várias pessoas no Brasil inteiro. No Iraque, morreram 50 numa explosão, entre elas várias crianças. No Rio de Janeiro, entretanto, ocorreu uma morte especial: a do menino João Hélio, de seis anos, filho de Élson e Rosinha e irmão de Aline. Esse casal acreditou no sistema, aceitou as regras do jogo. Queria colher os frutos deste nosso mundo e ser feliz. Para isso, fazia a sua parte sem prejudicar ninguém. Na quarta-feira, porém, aquilo que deveria ser um pequeno drama - vemos centenas deles na vida real e nos filmes americanos e muitas personalidades já confessaram que na juventude roubaram carros de pura farra - transformou-se numa tragédia. Cinco rapazes pardos - o mais novo com 17 e o mais velho com 23 - resolveram roubar o automóvel dentro do qual estavam Rosinha e seus filhos. Três subiram no carro e, com uma pistola aparentemente de brinquedo, expulsaram a mãe e as crianças. Até aí, temos um pequeno drama cotidiano que poderia ter ocorrido em qualquer país do Terceiro Mundo e nos EUA. O drama transformou-se em tragédia quando o pequeno João Hélio não conseguiu desvencilhar o pé do cinto de segurança e, porta trancada, foi arrastado por sete quilômetros, brutalmente mutilado antes de morrer. O que transformou essa tragédia em crime hediondo foi o fato de os criminosos terem conhecimento do que acontecia sem que, em momento algum, tentassem salvar a vítima.
Não vou discutir aqui a personalidade dos assassinos. Provavelmente, se Helinho fosse meu filho, num primeiro momento tentaria driblar a vigilância policial e matar um por um dos miseráveis, pois não sou santo. Num segundo momento, porém, venceria o intelectual, o homem civilizado que se perguntaria por que essas coisas acontecem. Os meios de comunicação, de um modo geral, limitaram-se a falar dos monstros assassinos, da volta da pena de morte ou de penas mais elevadas para determinados crimes. Por um momento, tive a impressão de que os responsáveis por tudo de mau que ocorre no nosso país são os cinco jovens assassinos; que se nos livrarmos deles, se os cortarmos em pedacinhos, se os desmembrarmos, tudo voltará ao normal.
O menino foi destroçado pelos criminosos e pelo cinto de segurança, cuja obrigatoriedade, venho dizendo há anos, precisa ser discutida, mas em verdade começou a ser morto há muito tempo. Primeiro, pelos assassinos dos índios, depois pelos importadores de escravos e até mesmo pelos burgueses inconfidentes dos quais não passou pela cabeça a morte de milhares de negros nas Minas. Depois, pelos franceses e ingleses e seus homens de palha e até hoje pelos Estados Unidos e grandes corporações transnacionais. Mais tarde, o menino foi morto pela princesa Isabel, que só libertou os escravos quando o mundo inteiro já o havia feito. Abandonados em sua maioria, foram levantar seus casebres nos morros e construíram as favelas e todos acharam muito natural seres humanos empilhados em casas de cachorro. Mais tarde, a burguesia diria: "A favela é perto de casa. Bom para os empregados e bom para nós".
Quando um homem - o único estadista deste país - Getúlio Vargas garantiu os direitos dos trabalhadores, foi assassinado e, entre tantos brancos envolvidos, só um negro foi preso.
Tão decentes, trabalhadores e talentosos eram a maioria dos favelados que boa parte da nossa cultura (hoje agonizante graças à televisão e à brutal interferência norte-americana) baseava-se neles. As favelas podiam não ser bonitas, mas produziam música e trabalho e não tóxico e morte. Pelo menos até 1968 a criminalidade era mínima nesta cidade. A participação da ditadura militar na morte de João Hélio foi imensa e, quando ela já estava nos estertores, a cocaína fez sua entrada nas centenas de morros do Rio e hoje os moradores das favelas se dividem entre trabalhadores, traficantes e milicianos. Graças à cocaína, os meninos de morro que não tinham pais heróis como os do cinema ma para se espelhar, escolheram os traficantes. A religião neoliberal que vem assolando (vendendo, entregando) este país pelo menos desde a eleição de Fernando Henrique também estava no volante do carro que matou João Hélio e foi assim que jovens aviões viciados começaram a ter filhos com jovens prostitutas viciadas. A maioria não sabe o que é uma palavra de carinho, um gesto de ternura.
Sim, são muitos os verdugos do menino suburbano: O salário mínimo hipócrita, um código penal feito pela elite para favorecê-la, um sistema de saúde que exclui os pobres, um ensino público destrutivo, os grandes latifundiários. São ainda carrascos de João Helio os vereadores do Rio e o prefeito Cesar Maia, que só sabem trocar nomes de ruas. Os deputados estaduais envolvidos em crimes terríveis como o trabalho escravo, a começar pelo presidente Picianni. Há ainda o fenômeno Garosinha, e seu secretário de Segurança que também é deputado e chefe de quadrilha. Policiais envolvidos com o crime porque ele paga mais. O que dizer dos empresários que acham que emprego é favor e repasssam para o povo todos os impostos de um governo que só sabe governar aumentando os impostos? Entre os maiores assassinos indiretos do garoto estão os deputados federais envolvidos em crimes e alguns senadores trilionários.
Já fomos um povo civilizado, culto, politizado, mas não conseguimos resistir a quase 30 anos de tirania, um Sarney, dois Fernandos e um Luiz Silva para não falar da importância da TV Globo na cretinização do indivíduo.
Luiz Silva era a última esperança do povo, mas ele traiu os pobres entre os quais nasceu. Foi quando mataram um anjo. E, pela primeira vez na minha vida desde a morte de Getúlio, vi uma manifestação de pesar verdadeiramente sincera. A grande maioria acha que chora a morte de João Hélio, mas chora seu próprio abandono. O pai de João Hélio entendeu que a morte de seu filho não foi em vão e tem condições de unir o povo, pois disse: "um povo que faz um presidente e depois o expulsa tem condições de fazer muito mais". É um outro modo de dizer uma frase que uso muito. Somos todos pais de todas as crianças do mundo.
Nunca houve momento melhor para provarmos que o jornalismo no Brasil não morreu e pode ser independente. Onde estão os nossos repórteres que investigarão esse crime a fundo a fim de que possamos entender o Brasil e como chegou à calamidade física, mental, ética e ambiental. O povo e a imprensa - se quiserem - poderão exigir respostas e cumprimento da Constituição, dos Direitos do Homem e dos sempre eficientes dez mandamentos.
Sou um cético e um homem de fé e talvez os anjos existam. Não dizem há séculos que só um milagre salva o Brasil? Talvez João Hélio seja um anjo que morreu para unir os pobres desse país desgraçado. O triste carnaval acabou. Os sinos estão tocando. E dobram por ti.



Jornal do Brasil (24/02/2007)

sexta-feira, 18 de maio de 2007

A escola em que nossos filhos não estudam

Certos temas não podem ser esquecidos com facilidade, simplesmente porque colocá-los em arquivos pouco visitados do nosso cérebro seria uma ofensa considerável àqueles que lutam para o mundo continuar girando no ritmo de sempre, sem taquicardia.

É assim, citando algumas, com o caso dos "filhinhos de algo" (fidalgos), de Brasília, que resolveram atear fogo no índio pensando ser mendigo – mendigo dentro de pouco tempo não será gente – por pura "brincadeira" de pessoas que, teoricamente, "pensam" este país; o assassinato do menino João Hélio e a inevitável discussão sobre maioridade penal, falha do sistema judiciário e carcerário, assim como um maior rigor das penas aplicadas; a "síndrome de balas perdidas" no Estado do Rio de Janeiro, a guerra urbana e a estreita ponte entre os incluídos e os excluídos; os dólares na cueca, a compra de favores e a história de uma luta válida manchada por pura prepotência e muita sacanagem; os votos suspeitos para a aprovação da reeleição e, agora, a "aprovação automática" em todos os ciclos do Ensino Fundamental nos colégios municipais do Rio.

Sim, é preciso que se coloque tal medida (portaria) junto às mazelas graves deste país porque o efeito futuro pode ser (e tudo leva a crer) devastador.

Ouve-se muito a palavra "domínio de turma", ou seja, dentro da educação equivale a dizer que o professor sabe controlar a turma impondo sua "autoridade" e entretendo os alunos com sua "bagagem". Ora, professor não é domador para ter "domínio de turma", não é polícia para ser temido por sua "autoridade" e nem é palhaço para entreter os alunos com a sua "bagagem" (exageros meus à parte). Porém, no estado em que se encontra a educação, o professor costuma ser tudo isso, menos educador, seu principal papel.

Quando tudo parece embaçado, tenebroso, obscuro, percebe-se que o poço (essa tal de educação) não possui profundidade, ele é "romanceado", extraído da mente de um Stephen King ou algo que o valha. Quando a água parece salubre, vem o zelador do poço e urina dentro dele, talvez pra ver se escuta algum barulho ou para mostrar ao puxa-saco cotidiano que, como dizem, não há fundo.

Passei uma redação para alunos do Ensino Médio de um colégio particular na Baixada Fluminense sobre o "problema" educação e a polêmica em torno da "aprovação automática" – seja lá o que isso queira dizer. Giselle dos Santos, aluna do segundo ano, escreveu que "o aluno precisa ser avaliado e, no final, provar se merece o prêmio da "aprovação" ou não. Se por acaso, o aluno não for "bom" e continuar passando, o que será dele amanhã?". Concordo, um dia, depois de empurrar muito "com a barriga", encontraremos um muro intransponível, este muro se chama "mundo" – a vida pronta para ensinar as regras verdadeiras e duras da sociedade. Giselle salientou ainda que, mesmo com diploma, este aluno não saberá nada e, descartado do mercado de trabalho, tendo que sustentar família, optará inevitavelmente para o roubo, pois empregos não são dados de "mão beijada ".

Outro aluno, Bruno, estudante do primeiro ano, pergunta se não pensaram na motivação (ou a falta dela) dos alunos que realmente se interessam. Será que tal atitude não despertaria o rancor daqueles que dão duro nos deveres e estudam de fato? Este é outra carta neste jogo perigoso. Deveríamos estar jogando com a educação? Talvez não.

Para a estudante Adriana Ferreira, outra aluna do segundo ano, a palavra "aprovação" significa demonstração por atos, palavras ou gestos, de que se concorda com algo; concordância. O que Adriana quer dizer com o Aurélio em mãos é: como a "aprovação automática" se encaixa no sistema educacional? Como "fazer" educação de verdade se, ao invés de concordância, estamos caminhando para o aparthaid?
Deus não joga dados, nós também deveríamos "não fazer" o mesmo.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Classificação, sim!

Muitos dizem que a classificação dos programas televisivos é um insulto à democracia e a liberdade tão duramente conquistada. Insulto é ouvir esse choro. Insulto à minha e à sua inteligência!
Reproduzo, agora, o que Alberto Dines escreveu em seu Observatório da Imprensa com tanta lucidez e precisão:
CLASSIFICAÇÃO & PUBLICIDADE
Em defesa da lei da selva na terra de ninguém
Por Alberto Dines em 15/5/2007

Os norte-americanos criaram os neo-cons, neo-conservadores, turma da pesada cujo símbolo é o dedo no gatilho – primeiro atiram e depois perguntam quem vem lá.
No Brasil, terra dos pudores e manhas, é difícil achar quem queira assumir-se integralmente como neo-lib, neoliberal. Preferem o uniforme "libertário", sem se incomodar em parecer os antigos anarquistas que combatiam qualquer ação reguladora do Estado.
Estes libero-anarquistas detestam normas, limites e ordenações, prostrados aos pés do Deus do Mercado e de sua cônjuge, a Deusa Livre Iniciativa. Usam o crachá de democratas, mas desprezam solenemente o bem-comum, o interesse público, a comunidade e a sociedade.
Esse é o mix ideológico do estranhíssimo lobby que reúne os adversários da classificação indicativa da programação de TV e da regulamentação da publicidade de cervejas na mídia eletrônica. O denominador comum é o rancor contra qualquer tipo de regulamentação. Em nome de uma liberdade imprecisa e indefinida, advogam a lei da selva.
Compromissos esquecidos
A classificação indicativa da programação da TV, assim como o controle sobre a publicidade de bebidas alcoólicas, está prevista de forma explícita e insofismável em diversas passagens dos artigos 220 e 221 da Constituição:
** "Compete à lei federal regular as diversões e espetáculos públicos, informar sobre a sua natureza e as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada (art. 220, parágrafo 3º, inciso I).
** "Compete à lei federal estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no artigo 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente." (art. 220, parágrafo 3º, inciso II).
** "A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais nos termos do inciso II do parágrafo anterior e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso." (art. 220, parágrafo 4º).
O citado artigo 221 prevê no seu inciso IV que a produção e programação das emissoras de rádio e TV devem respeitar "os valores éticos e sociais da pessoa e da família".
O legislador-constituinte não foi casuísta, foi preciso. Excepcionalmente claro e objetivo. Não deixou qualquer contradição entre a letra e o espírito da lei como muitas vezes acontece. Preocupado com o uso indevido das concessões de rádio e TV – e com as confusões costumeiras entre o público e privado – amarrou muito bem a regulamentação sobre a programação e sobre a difusão de publicidade nociva à saúde. O interesse comercial não pode impor-se ao interesse social, sobretudo numa esfera claramente pública (o espectro da radiodifusão).
Os juristas contratados pelas cervejeiras, empresas de radiodifusão e de propaganda desta vez precisarão suar as suas camisas de seda para encontrar aquelas famosas brechas ou imprecisões que convertem nossas leis num emaranhado de lapsos. Estranha muito que o Conar, geralmente apontado como paradigma de auto-regulamentação, no caso dos comerciais de cerveja esqueça os seus compromissos com a saúde pública, seduzido pelas fabulosas verbas de publicidade das cervejeiras.

Celebridade instantânea
O governo Lula não inventou coisa alguma em matéria de classificação indicativa. Deu seqüência ao trabalho de José Gregori ao tempo em que ainda era Secretário de Direitos Humanos do governo FHC, ao igualar a baixaria televisiva a um atentado aos direitos humanos.
Agora os neo-libs nativos, a pretexto de fidelidade libertária, passam ao largo dos compromissos com a preservação dos valores humanos e morais indispensáveis à democracia.
Os ministérios da Justiça e da Saúde e a presidência da República estão certos ao exigir uma regulamentação nessas duas frentes. O único erro foi a proposta de vedar às celebridades a participação em comerciais de cerveja. Aqui houve intenção de discriminar: a celebridade não tem culpa de ser célebre. Na sociedade do espetáculo em que vivemos a fabricação da fama é instantânea – ou quase. Em apenas 15 minutos qualquer pagodeiro desconhecido pode converter-se num celebrado Zeca Pagodinho.

Obra coletiva
Estão errados os neolibertários, liberalóides e falsos democratas ao impedir que a sociedade brasileira produza os antídotos necessários à defesa da saúde e à formação das crianças e adolescentes.
Nos EUA, pátria do liberalismo e da resistência às regulamentações, a classificação etária para a exibição de filmes em cinemas ou teatros tem mais de meio século. Algumas decisões são eventualmente contestadas, mas ninguém ousaria opor-se à idéia de eliminar os limites. As redes abertas de TV também adotam princípios rígidos para compatibilizar sua grade com horários e faixas etárias.
O processo civilizador, como obra coletiva, impõe normas. Pretender uma civilização do tipo vale-tudo leva fatalmente a um intransponível beco sem saída.

segunda-feira, 14 de maio de 2007

A máquina

Esta foi achada entre anotações. Faz parte das "músicas para bandas imaginárias" (já estive em algumas, imaginárias e reais). A música não será postada aqui, o poema, sim. Continuo achando que, infelizmente, ele será muito atual durante tempos (não pra sempre). Enfim... A máquina:

Você que não sabe a diferença
De estar sobre ou sob o suor do descaso
Que só quer gozar e contar pros amigos
Você que não sabe o motivo
E que acha o que acham os outros
Não pode saber do abrir de uma perna

Você que assim como eu
Omite a verdade pra ser entendido
Na roda comum viciada em regras
Que não foram escritas

Você que assim como eu
Só é mais um produto made in T.V.
Que vislumbra o futuro e não faz o presente
À sua frente

Você que é assim como eu
E eu sou apenas o que você quiser
No mundo de todos e fora de alguns
Que manipulam.

domingo, 13 de maio de 2007

Os igrejistas e o amor

Em sua coluna deste sábado (Fé ou afeto?) em O Globo (12/05), Zuenir Ventura levanta uma questão interessante: apesar dos católicos, numerosos aqui no Brasil, dizerem-se fiéis, a desobediência aos dogmas e preceitos morais da igreja é uma constante e curiosa contradição. Zuenir escreveu com sabedoria em sua conclusão:

De qualquer maneira, as divergências não impediram que 40 mil jovens, alegres e entusiasmados, se reunissem no Pacaembu para ver e ouvir Bento XVI. Uma menina ali presente, que se declarou católica praticante, desfez um pouco o mistério numa entrevista. Disse que não concordava com as diretrizes do Papa e da Igreja sobre o uso da camisinha, mas se recusou a criticá-los por isso. “É a realidade deles, não é a nossa”, argumentou, compreensiva, como provavelmente faria com seu próprios pais, que não deixariam de ser queridos por estarem meio ultrapassados. Sua discordância não exclui o respeito e o amor. Uma hipótese é que a religiosidade dela e de sua tribo talvez passe mais pelo afeto do que pela fé.

Concordo plenamente com esta reflexão. Acredito que este seja um caminho tranqüilo para, não só a compreensão dos “pais e papas”, mas, com o tempo e o contínuo exercício de amor e respeito, a tolerância verdadeira para com as diferenças religiosas, dogmáticas e, é claro, atéias, agnósticas. Afirmo, inclusive, que o passo para o alinhamento pacífico entre ciência e religião está para ser dado com jovens neste nível de discernimento.
Na ponta da faca ninguém conseguirá ser feliz, estamos aprisionados e sofremos de crises existenciais profundas simplesmente porque o mundo anda uma “bosta”. O homem, e suas políticas gerais, não avança como gostaríamos e o nosso ópio, nossa moeda de troca chamada religião parece-nos, por vezes, intolerante, retrógrada e difícil. Alguns dizem que isso são os testes de Deus, eu digo que é puro masoquismo. Sou extremamente religioso (no sentido de me ligar a algo Maior), mas concordo com a católica da entrevista citada por Zuenir: “é a realidade deles, não a nossa”.

Aprovação(?) automática

O assunto da aprovação automática nos colégios municipais da cidade do Rio de Janeiro fez com que a educação ficasse reprovada em matérias importantes como Autoridade, Dignidade, Cidadania, Respeito, e fosse aprovada automaticamente em matérias recém criadas e vergonhosas como Oportunismo, Demagogia, Analfabetismo letrado.
Polêmica resolução só pode ter sido criada por indivíduos que nada entendem de sistema educacional, nunca pisaram em um colégio público e estão pouco se "fufu" para qualidade e formação da cidadania.
Esta bestialidade resolutiva renderia um blog inteiro, mas a corrente é grande e há pessoas extremamente qualificadas para debater o assunto.
Quem quiser, recomendo uma visita ao blog Reação Cultural (http://reacaocultural.blogspot.com/), o colunista Halem Souza debruçou-se sobre o "problema" educação de forma clara e precisa.
O Jornal do Brasil desse domindo (www.jb.com.br), A23, noticia o que professores andam fazendo depois da "ordem aprovatória". Já na Segunda (14/05), A11, a coluna do economista Ubiratan lorio discorre sobre o assunto de forma correta, irônica e muito bem escrita.
Sociedade Brasileira, manifeste-se antes que seja tarde!

sábado, 12 de maio de 2007


Esta, assim como a imagem anterior, foi tirada do jornal eletrônico Montbläat (www.montblaat.com.br) . Tal propaganda poderia ser de um humor negro genial - como as do SINAF - se não fosse tão "bizarramente tosca". os achados do Fritz Utzeri estão cada vez mais incríveis... E o Brasil também!

quinta-feira, 10 de maio de 2007

Primavera

O sorriso em seu rosto era inevitável? Esperava há quanto tempo àquela proposta? O que se sabe são os fatos, mas esses, quando não fotografados ou filmados, necessitam das vistas e das bocas humanas para vibrarem como acontecimentos, e essas, não são confiáveis, haja visto que cada um possui a sua própria interpretação, a sua maneira de ver (e não ver) as coisas; se bem que dependendo do posicionamento das câmeras, o seu foco,... Enfim, a proposta fora esperada por muitos anos. Uma vez ele se viu por baixo, havia cometido uma das piores formas de erro: a omissão; fora julgado moralmente pelos que se diziam seus amigos e moralmente violentado pelos que não o conheciam. Em um estalo de lucidez, decidira consolar-se, refugiar-se nos braços do seu único amor... Um olhar de desdém, superioridade exalado da mulher que venerava aniquilou-o profundamente. O que a sociedade pensava ou exigisse, para ele, era apenas isso: um preço a se pagar de cabeça baixa, mas aquele olhar – logo ela! – vindo do seu porto-seguro, do cristal que o energizaria, que o abraçaria e o reergueria, das cinzas do erro ao vôo do triunfo... (pensara ele na época). Lastimou-se, morreu um pouco a cada dia, várias vezes, até que em um dado momento resolveu viver, deu-se a chance que outros recusaram-lhe dar, furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio, assim como a flor de Drummond; sentou-se na Capital e nele mesmo, vislumbrou-o como em um espelho e aceitou-se. Trabalhou duro e obteve um parcial perdão. Bem, na verdade, com o tempo, muitos esqueceram o seu feito – ou não-feito, em se tratando de omissão – e outros, apenas acostumaram-se devido aos outros acontecimentos abruptos e acumulados, muitos mais graves e excitantes. Trabalhou pesado em prol de tudo, quis se levantar aos poucos mas de uma vez por todas e em todos os sentidos, tanto moral quanto financeiro. Conseguiu. E ali estava ele!, outrora tão longe dele mesmo, hoje, tão líder de si. Ela pegou em suas mãos com delicadeza, havia sinceridade no seu olhar, ambos pensavam no preço que fora pago. Ela pensou que também cometera um grave erro. Ele sabia que ela um dia compreenderia e aceitaria o seu erro, então, deixou que suas mãos fossem conduzidas ao rosto suave da mulher, ela cheirou e beijou-as com carinho e ele sorriu. Era inevitável? E por que não? Esperou anos para que isso acontecesse, odiou, bradou, corroeu-se, odiou-se, serenou, conheceu-se. Estava ali, ali ficou consigo e com ela durante um bom tempo. Ela fez novamente a proposta achando que talvez ele não a tivesse escutado claramente. Foi quando olhou-a desarmado, lágrimas nos olhos, comovido com a paz, o vento em seu semblante, a transpiração no copo com suco de laranja, e disse:
– Sim.

Educar é isso?

Chiclete entra em sala e perturba tanto a professora (essa profissional pessimamente remunerada) que consegue parar na coordenação. Lá, a orientadora pedagógica, outro ser que, além de ganhar uma miséria e conversar com Chiclete, precisa explicar para a mãe do aluno que seu filho não está conseguindo alcançar o nível esperado... A mãe dá de ombros e volta para o botequim onde consumia doses pesadas de cachaça enquanto pensa no marido que fugiu com outra mais jovem e nem pensão dá para o filho que simplesmente é violento com seus colegas de colégio.

Parece ficção, mas essa é uma realidade no Estado do Rio de Janeiro, principalmente em seus vastos e imensos subúrbios. Os colégios públicos sofrem com a completa falência governamental. É claro que à professora cabe a função de ponte (entre o aluno e o suposto "conhecimento"), não cabem ao profissional da educação papéis, às vezes, bem mais exigidos do que a própria função: palhaço, policial, psicólogo. Ao professor cabe a função de lecionar e ser incansável na busca do melhor caminho entre o aluno e a matéria, entre o estudante e o mundo. De repente, uma onda de mazelas político-financeiras, sócio-culturais tomam conta de toda a situação como se fossem membros de um só corpo, cadáver do mesmo defunto que não quis morrer nas balas perdidas cariocas, já estava morto de fome esperando o pires dos governos vigentes, programas sociais que são apenas midiáticos (e patéticos).

Ao nos depararmos com Chiclete, precisamos ter isso tudo em mente para que ela fique aberta e possa ser receptora de canais por vezes controversos, não preconceituosos, deformadores. Contudo, não é papel do professor ser feito de fantoche, palhaço simplesmente porque cultura, educação (verdadeira) e dignidade não cabem no PAC(man) da vida real. Enganaram-nos, esse jogo nunca foi para crianças!

Não é com "avanços retrógrados", "sensibilidade bruta", e todos os paradoxos que um governo pode ter ou provocar que se ganham certas guerras. Alguém poderia me explicar o que sejam ciclos de aprovações automáticas da primeira a oitava séries do Ensino Fundamental? Alguém poderia me dizer por que estamos imitando modelos de países desenvolvidos quando a nossa realidade é outra? Alguém poderia me dizer como isso faz sentido e é bom para o Brasil?

Por que os bons (e caros) colégios deste país, em sua maioria absoluta, não adotam tal medida?

Imagino o professor entrando em sala, tentando explicar da melhor maneira possível (e impossível) os mecanismos do bom aprendizado e 30% da turma "cagando" para a aula, simplesmente porque, afinal, todos serão aprovados.
É possível construirmos uma base educacional de qualidade e competitiva (como quer o nosso presidente) desse jeito? Se for possível, escrevam-me. Eu não entendi nada.

terça-feira, 8 de maio de 2007

O Fato

De repente ele viu o inesperado, o que não fazia sentido algum. De repente tudo o que ele acreditava virou pó ou coisa parecida. Não havia em sua lógica explicação plausível para o que acabara de ocorrer, estava tudo tão confuso em sua mente que por um momento achou que estivesse louco. Fechou os olhos, apertou-os a fim de os ter limpos da brisa. Aquilo que se mostrara não poderia ser real... Fechou os olhos outra vez, estava com medo, sentia toda a sua pele arrepiar; deu as costas para o enigma e, como acontece com todos os humanos, teve a nítida impressão de haver alguém ou algo há poucos metros de distância. Não tinha outro jeito... Respirou fundo, encheu-se de uma coragem falsa e mutável, mas suficiente para fazê-lo virar a favor do estranho acontecimento. Queria falar qualquer coisa, a voz não saía, percebeu que tremia da cabeça aos pés; queria correr, mas os seus músculos estavam contraídos demais. Sentiu-se sufocado, angustiadamente impotente diante de tal situação. Foi nesse momento que começou a chorar compreendendo a sua pequenez, o niilismo. Chorou como uma criança, feito um ser virgem que é tocado pela primeira vez e corrompido com as dores do mundo profanamente humano; chorou como se chorar fosse a única coisa que fizesse sentido. Chorou porque isso era inevitável e porque ele era humano demais. Estava claro que seria impossível alguém acreditar naquilo, não adiantaria nada contar; sem dúvida que esse seria o seu segredo para sempre, seria o seu acontecimento secreto. Estava iniciado no reino do desconhecido e, talvez algum dia, pudesse refletir de maneira sóbria e científica, mas naquele momento, naquele derradeiro momento, nem ele e nem ninguém poderia explicar ceticamente o que estava diante dos seus olhos, e isso era um fato.



quarta-feira, 2 de maio de 2007

Esta foto saiu no jornal Montbläat (www.montblaat.com.br) semana passada. Absolutamente genial a capacidade do povo brasileiro. Gostaria de escrever um texto muito florido e irônico, mas a imagem fala por si.

terça-feira, 1 de maio de 2007

A educação quer comida virtual


A decisão do Governo Federal relativo à instalação de salas de informática nas escolas públicas de todo o país é de uma relativa eficiência. Se tudo der certo e o ensino da “linguagem digital” for um sucesso, ainda faltará resolver o maior dos problemas: tirar o Brasil do triste ranking dos países de ensino medíocre. Isso não se faz com informática.
Não se pode, no entanto, menosprezar a implantação de tais salas em rede pública; isso significa um avanço rumo à meta da “inclusão digital”. Todos precisam estar inseridos neste contexto, pois só assim progrediremos em um mundo que exige “diferenciação”, “multifuncionalidade” dos seus trabalhadores. Informatizar os colégios é dar um passo importante e verdadeiro para o futuro.
Obviamente, a inclusão digital não trará benefício algum se o objeto da inclusão (o aluno) não receber as condições básicas para assimilar ou mesmo colocar em prática tal ferramenta. Se um adolescente não consegue entender conceitos mínimos de contextualização, coerência textual, intertextualidade, enfim, se não consegue analisar corretamente um texto simples, que futuro há para esse aluno? Se a estrutura escolar não oferece segurança, luz, água, que espécie de sociedade estaremos criando? Se os profissionais responsáveis pela ponte entre o conhecimento e o estudante recebem uma miséria de salário e é depreciado pela própria sociedade (é o coitadinho, o sofredor), fica e ficará cada vez mais difícil atingirmos alguma qualidade ou luz nesse túnel fétido e escuro que se chama educação no Brasil.
Aliás, presentear com um (ou uns) computador um colégio sem eletricidade ou funcionando em algum quintal improvisado, com educadores recebendo menos de três reais (R$ 3,00) por dia não é virtude, é afronta.
Mostrar os benefícios de um software livre e ensinar sua respectiva “linguagem”, pesquisas na Internet, aulas de Geografia aliadas aos programas certos (google earth, etc.), programas educativos, ministrar cursos para a sociedade participante (pais e vizinhos da escola) é de uma sensibilidade política exemplar, mas ficar só nisso é mostrar o novo e ficar preso ao velho. Sem orientação não há produção.
Contudo, o desejo do Governo é positivo e pode gerar frutos difíceis de se ver por aqui, basta que a sociedade não se cale, manifeste a vontade de participar e contribua para que a decisão tenha diálogos abertos.