O que ele queria dizer era simples, contudo, fatos externos complexavam e dinamitavam a vontade, calavam a boca entreaberta e o suspiro da frustração era a única coisa realmente concreta que emitia. Era sempre assim: na hora “h”, alguma coisa antiga retornava à lembrança como um sopro já muito deixado, mas que ganhava força, impacto ao chegar à margem; uma onda de pensamentos que simplesmente entorpeciam a subjetividade e priorizavam a lógica sem graça e sem vida que era o seu cotidiano. A receita, todos tinham, como não poderia deixar de ser. Todos sempre têm a receita infalível para a resolução dos problemas do mundo, menos os de si próprios (é clichê, sabe-se, mas não é verdade?). O que ele queria dizer ficou boiando em algum mar distante, rumo a lugar nenhum; uma garrafa atirada sem certeza de um leitor, um e-mail que nunca sai do rascunho. Os olhos d’água que possuía nada revelavam, não amanheciam, não significavam; vez em quando adquiriam o hábito de ofuscar, viajar por climas áridos, inundando a alma invernal de areia e vento. O invólucro que carregava adquiria constantes paradoxos, resquícios de samba e quarta-feira de cinzas. Um dia ele tomou coragem, caminhou pela floresta incendiada que era o seu coração. Palpitando, transbordando em sentimentos confusos, desnorteados, respirou o ar mais poluído da grande metrópole, absorveu a expiração das pessoas que o cercavam e encheu-se de azedume, uma murrinha saliente quase escapou pelos cantos da boca, mas ele conteve, como se aquilo fosse um gás milagroso que pressionaria as cordas vocais. Não podia perder a oportunidade. Abriu a boca! Foi quando pensou em Drummond, em Clarice, nele mesmo. Não quis lutar com as palavras e nem com a força que doía em seu estômago. O que ele queria dizer era simples, mas nunca disse.
quarta-feira, 23 de janeiro de 2008
O que ele queria dizer
O que ele queria dizer era simples, contudo, fatos externos complexavam e dinamitavam a vontade, calavam a boca entreaberta e o suspiro da frustração era a única coisa realmente concreta que emitia. Era sempre assim: na hora “h”, alguma coisa antiga retornava à lembrança como um sopro já muito deixado, mas que ganhava força, impacto ao chegar à margem; uma onda de pensamentos que simplesmente entorpeciam a subjetividade e priorizavam a lógica sem graça e sem vida que era o seu cotidiano. A receita, todos tinham, como não poderia deixar de ser. Todos sempre têm a receita infalível para a resolução dos problemas do mundo, menos os de si próprios (é clichê, sabe-se, mas não é verdade?). O que ele queria dizer ficou boiando em algum mar distante, rumo a lugar nenhum; uma garrafa atirada sem certeza de um leitor, um e-mail que nunca sai do rascunho. Os olhos d’água que possuía nada revelavam, não amanheciam, não significavam; vez em quando adquiriam o hábito de ofuscar, viajar por climas áridos, inundando a alma invernal de areia e vento. O invólucro que carregava adquiria constantes paradoxos, resquícios de samba e quarta-feira de cinzas. Um dia ele tomou coragem, caminhou pela floresta incendiada que era o seu coração. Palpitando, transbordando em sentimentos confusos, desnorteados, respirou o ar mais poluído da grande metrópole, absorveu a expiração das pessoas que o cercavam e encheu-se de azedume, uma murrinha saliente quase escapou pelos cantos da boca, mas ele conteve, como se aquilo fosse um gás milagroso que pressionaria as cordas vocais. Não podia perder a oportunidade. Abriu a boca! Foi quando pensou em Drummond, em Clarice, nele mesmo. Não quis lutar com as palavras e nem com a força que doía em seu estômago. O que ele queria dizer era simples, mas nunca disse.
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4 comentários:
Marcelo:
Ah, a força das coisas não ditas, o poder do grito sufocado... Um dia explode num berro de revolta e angústia.
Angústia! É isto! Esta foi a sensação que o conto me passou.
***
"Um dia ele tomou coragem, caminhou pela floresta incendiada que era o seu coração." Duca!
***
Um abraço.
"diga a verdade e saia correndo" - provérbio iugoslavo.
Professor, invejo - mas numa boa, riléquis - quem, como tu, tem o poder de dizer tanto em tão poucas palavras.
clap, clap, clap.
baita abraço meu
Às vezes parece que as coisas mais simples são as mais difíceis de se dizer. O que é que eu digo agora? Simples: você já é um escritor, Marcelo, um excelente escritor.
beijo grande
Ele não disse. Que bom que você diz, e diz muito bem, MARCELO!
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