quinta-feira, 19 de julho de 2007

Essa vida da rua


Fernando Calazans, um dos melhores jornalistas esportivos deste país, publicou um texto, em O Globo (18/07/2007 - Esportes - pág.:15), simplesmente fantástico intitulado "Essa vida da rua". Para mim, mais do que uma coluna sobre esportes, uma produção textual sobre o limite humano, uma ode à superação. Calazans sai emocionado. E eu também. Vamos à coluna:


"Depois do ouro no pódio da Copa América, na Venezuela, vamos deixar a seleção brasileira e o Dunga um pouco em sossego (até para ver se ele se cura da irritação que o domina) e vamos dar um pulo no pódio do Pan-Americano, mas, por coincidência, ainda com o tema das crianças, abordado ontem. Eram as crianças do Pelé, no milésimo gol, e as crianças do Dunga, na Copa América.



Cada um a seu tempo, o ex-jogador e o atual técnico dedicaram as duas façanhas às crianças, Pelé mais atento às crianças pobres do Brasil, Dunga mais preocupado com as crianças do mundo inteiro.


O primeiro atleta brasileiro a ganhar o ouro, o Diogo Silva, no Taekwondo, não se dirigiu às crianças em geral, mas a uma criança em particular - a criança que era ele próprio, a criança que ele próprio foi.


Mais do que seu choro contido no primeiro lugar do pódio, ao ouvir o hino brasileiro, o que me impressionou foi a autenticidade de suas primeiras declarações. Muito emocionado ainda, ele disse mais ou menos isso: "O taekwondo é tudo para mim. Foi o que me fez largar essa vida da rua para chegar até aqui".


Dunga e Pelé que me perdoem, mas as palavras do Diogo foram mais fortes, mais sofridas e mais vividas do que as deles - sem querer desmerecer a sinceridade de um e de outro.


Diogo Silva não se dirigiu às crianças, nem pediu por elas. Ele mesmo era a criança pobre, sem muitas perspectivas, que o taekwondo - quer dizer, o ESPORTE - fez largar a "vida da rua", a vida maldita que o conduzia para muito longe dos pódios e dos hinos.


Será que as autoridades dos esportes, dos governos, dos patrocínios, não se sensibilizam e não se convencem de que o esporte - qualquer um - é uma das formas mais bonitas, mais decentes e até mais úteis para o país, a nação - uma forma de tirar crianças das ruas? Uma forma de colocar o Brasil nos pódios?


Não peço por atletas de alto rendimento, o atleta que o Diogo Silva é hoje. Mas sim pela criança que o Diogo Silva foi. Essa, a chamada base, deve ser o alvo dos programas esportivos e sociais. Não que o Diogo Silva adulto não precise de estrutura e de patrocínio. Até precisa. Mas o Diogo Silva criança é que precisa mais.


O Diogo Silva heróico, medalhista de ouro, do qual peguei emprestada a expressão "essa vida da rua" para - em sua homenagem - dar título à coluna."



Um comentário: