Publico esta magnífica reflexão/indagação de um grande jornalista: Mauro Santayana. Saiu no Jornal do Brasil, no espaço "Coisas da Política"(País - A2). Publico também para complementar a reflexão iniciada por Acantha em seu blog Banalidades Raras.
Coisas da Política
Mauro Santayana
O direito de reunir-se, sem armas, para manifestar coletivamente sua opinião, é assegurado a todos. Os tempos modernos têm sido bem mais tolerantes no que se refere às minorias. Sendo assim, os desfiles de homossexuais se tornaram comuns, muitas vezes com o apoio de pessoas de conduta social conservadora. Por que não aceitar que certa minoria de brasileiros, privilegiados pelo talento em ganhar muito dinheiro, possa expor seu inconformismo com o governo? São pessoas que se dizem cansadas. As faces das quatro grandes musas do movimento, expostas nos anúncios divulgados, mostram, mesmo sob sorrisos, o tédio dos que vivem sans souci. Algumas são veteranas no ofício do entretenimento, como a apresentadora Hebe Camargo e a atriz Regina Duarte, outras, recém chegadas à ribalta, como a cantora Ivete Sangalo e a senhora Ana Maria Braga. Uma coisa é certa: elas podem não gostar do governo, mas não se queixam de sua excepcional situação na distribuição da renda na sociedade brasileira. Estão todas muito bem de vida. Ganharam honradamente seu dinheiro, divertindo as massas, fazendo-as esquecer as agruras do cotidiano. São, com todo o respeito, como os jogadores de futebol, que encantam o nosso povo com sua particular inteligência do espaço retangular em que atuam. É certo que levam, sobre eles, uma grande vantagem, a de durar no ofício, como é o caso exemplar da senhora Camargo.
Ninguém gosta plenamente do governo - nem mesmo os seus membros. A disputa interna pelo poder, que as conveniências escondem, revela esse mal-estar. O próprio presidente não pode estar satisfeito com o desempenho geral da equipe. Piove, governo ládro, diz o provérbio italiano, para debitar aos governos até as chuvas indesejáveis. Mas, convenhamos, é difícil identificar - a não ser se aceitarmos a vigência do preconceito - a razão do cansaço dessas senhoras e desses senhores que organizaram a manifestação marcada para hoje. De uma só delas, da senhora Braga, pelo que se conhece de sua biografia, temos notícias de vicissitudes, antes e depois da oportunidade do estrelato. O seu êxito na televisão se deve, sobretudo, ao low profile, que a identifica com as mais simples donas-de-casa, o que talvez explique o seu recrutamento. Lamente-se que se tenha deixado envolver pelo movimento.
Os especialistas em sondagens de opinião sabem que os cidadãos pobres, mais do que os da classe média, sabem distinguir entre o mundo do espetáculo e o mundo da realidade. A vida é colorida pelo efeito da técnica de tratamento da imagem transmitida. Fora do pequeno retábulo, o mundo é outro. Os cidadãos pobres sabem que, com todos os seus penosos sacrifícios, a vida está melhor hoje, para eles, do que nos governos passados. Mas não são apenas os trabalhadores pobres. Os homens de negócio - que protestam, com suas razões, contra a prorrogação da CMPF - estão ganhando muito, e disso é prova o aumento de bilionários e multimilionários no Brasil.
O cansaço das dondocas (a expressão não é minha, é do conservador Cláudio Lembo) é o de ver um operário governando o país, na sucessão a elegante e cultivado scholar. Vivendo no mundo do faz-de-conta, essas senhoras raciocinam com o esprit de corps: querem um ator na Presidência - como foi o seu ídolo. Um ator capaz de memorizar os scripts, simular emoções, mudar rapidamente de papel, seduzir as platéias e interpretar a arrogância dos caubóis, como faziam John Wayne e Gary Cooper.
Quanto ao senhor Dória, ele está no seu papel de agente promotor de eventos. O que não se entende é a posição da OAB de São Paulo - a não ser que seu Conselho esteja a serviço de ainda não identificados interesses.
6 comentários:
BUM! Desmascaremos os interesses implícitos para muitos(para nós não) desses pseudo patriotas. Como me indigno ao ver essas ações! Quem não sabe das práticas conservadoras da Regina Duarte? Aqueles com uma certa massa crítica conseguem identificar muito bem o que o autor do texto disse: estão cansada(o)s mesmo é de ver um operário no poder. A realidade não é um cenário de ilusões e a crua vivência do povo não permite engodos como esses.
Ai que raiva eu tenho!
bj Marcelo.
O que se vê é uma abominável hipocrisia, também do meio artístico que dorme em berço esplêndido e leva parte maior do bolo maior ainda. Boa noite*.*
E o que dizer do Sr. Sottolo, presidente-pernóstico da Philips, um dos "cansados maiores", debochando do Piauí?
Grrrrr... morro de raiva dessa nossa elite!
Mudando de assunto: grata, meu querido, por seu último comentário no dia do meu aniversário.
Beijos.
Sabe MARCELO querido... O que me cansa realmente é não ver a luz, no final do túnel...
Beleza! Porrada nos fariseus!
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