Não,
eu nunca tive uma camisa do Che Guevara, nem coloco nas prateleiras mais baixas,
ao alcance das mãos, o livro do Marx. Não sou dado ao socialismo e muito menos
ao capitalismo. Aliás, depois de ler o (ótimo) livro A História da Riqueza do Homem, do Leo Huberman, acredito muito
pouco em qualquer coisa construída pelo homem ou por deus; para mim, ambos são
ébrios dentro da tacanha intelectualidade humana. E sobre a camisa do velho
Che, a questão é justamente essa: ela serve aos dois propósitos para o bem e
para o mal.
Usá-la,
como muitos que conheço, como reconhecimento do enorme revolucionário que foi e
do imenso humanista em que se transformou é de uma legitimidade tremenda. Para
ele, dialogar com a direita e com o poder vigente da época era exercer um
monólogo tendo um muro à frente, logo, a revolução era o único processo
libertário. Para se ter uma visualização do que foi o Sr. Guevara, e os seus
pensamentos, recomendo 02 (mas na verdade são 03) bons filmes sobre ele: Diário de Motocicleta, do Walter Salles,
abordando a construção do homem revolucionário, e (pasmem!) um filme americano
(dividido em 02) do Steven Soderbergh chamado Che, com ótima atuação de Benicio Del Toro, ator-produtor do filme.
Contudo,
a camisa, hoje, estampa não só uma ideia, mas um produto, uma marca. No mundo
capitalista que absorve e suga tudo, como um buraco negro, até o
anti-capitalismo vira varejo, assim como as camisas pretas dos roqueiros que as
compram como símbolo da negação consumidora e, na verdade, estão apenas consumindo
a outra ponta capitalista: comprar coisas para negar o capitalismo também é
capitalismo.
E
vemos milhares de camisas com aquela foto histórica do nosso Che, tirada por
Alberto Diaz, exibindo-se descaradamente em grifes que ele, certamente,
acusaria de estar lucrando ouro e pagando cocô na origem da sua feitura em
países que exploram o trabalho escravo e infantil. Camisas do Che que custaram
30 centavos para serem confeccionadas e são vendidas por 30, 40 dólares
naquelas lojas com vendedores insuportáveis que falam de chapéu Panamá sem
saber da missa-metade.
Mas
seria a solução certa parar a compra das camisas do Che? Seria ousado e
desafiador concluir este texto tacanho com este ápice e uma fajuta catarse
contra o sistema?
Eu
digo que não. As camisas do Che precisam ser compradas, mesmo com o perigo da
banalização.
Algumas
correntes querem que você tenha vergonha de usar a foto do Che porque o
objetivo é fadá-lo ao marketing e extirpá-lo do conceito de revolução. Ao expor
e saturar a imagem, separamos a foto da “pureza intelectual esquerdista” e da
sua “virgindade”. Ao colocar a foto na posição da vergonha mercadológica (tipo:
“você usa para provar algo que não é“ ou “você é incoerente comprando algo sobre
alguém que não aceitaria virar produto”), matamos o conceito, o ideal. O
objetivo dos críticos direitistas é esse: se eu não tenho heróis, vocês também
não os podem ter.
Nós
temos. E mostrá-los e saturá-los é bem melhor do que não os mostrar e
esquecê-los.
Portanto,
use a sua camisa. Por que não se pode mudar a sociedade a partir de dentro? Por
que não podemos nos vestir de capital e, junto a eles, fazer o social? E, olha,
não se envergonhe da maravilhosa história do Che ou da sua mensagem:
"[...] devemos trabalhar todos os dias. Trabalhar no sentido interno de aperfeiçoamento, de aumento dos conhecimentos, de aumento da compreensão do mundo que nos cerca. Inquirir, averiguar, e conhecer bem o porquê das coisas e colocar-se sempre os grandes problemas da humanidade como problemas próprios."
Um comentário:
Che Guevara foi um assassino.
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