quinta-feira, 5 de maio de 2011

Eros e Psique - A cupidez no Olimpo

Por: INÊS MOTAObjeto Obscuro

Conta a lenda que vivia uma asquerosa lagarta que em seu curto período larval passeava distraidamente pela horta de repolho roxo transgênico, daí a sua coloração. Ela era cleptomaníaca e roubava nacos do vegetal, não porque sentisse fome, mas para alimentar seu TOC e conferir uma corzinha vinho ao seu corpo e chamar a atenção quando fosse posar de fatal para fotos no red carpet.
Chamava-se Psique e, conforme está escrito na mitologia, pouco tempo depois, superando todas as dificuldades, infortúnios e sofrimentos, desperta do sufocante estado de pupa/túmulo e se transforma numa linda e leve borboleta de asas diáfanas, embelezando toda a plantação de soja florida na primavera que despontava em Mato Grosso do Sul. A soja da Amazônia será mencionada posteriormente e até lá talvez já não haja mais floresta alguma.

Está claro, entretanto, que isso tudo não passa de uma metáfora: Psique era em verdade uma delicada e formosa jovem com um par de asas que dava gosto ver e que se preparava para viver com plenitude um grande amor. Formiga, quando quer se perder, cria asas. Isso se aplica também às lagartas.
Entretanto, Vênus, a bela deusa vulgarmente conhecida como Afrodite aqui na Grécia, revoltada por haver desposado Vulcano – o deus manco, fedorento e impotente que forjava o ferro, mas sempre negava fogo quando ela precisava – e não com o gostosão Marte, com quem passou a ter uma relação adúltera, mas principalmente por invejar a beleza de Psique, resolve tramar contra esta.
Assim sendo, ordena a Eros, vulgo Cupido aqui em Roma, o seu filho, que dê um jeito de Psique se apaixonar por um ser horrendo. Mas o plano não transcorreu exatamente como esperado. Eros, embora ardiloso, esperto, jovem e mentiroso pela própria natureza, não resistiu aos encantos de Psique e acabou tornando-se seu amante. Na moita, evidentemente, pois Afrodite cortaria as asinhas deles se viesse a saber. Ele a levou para a cobertura de um belo apart-hotel com piscina, sauna e tudo que a tinha direito uma bela mortal e os traficantes dos morros do Rio de Janeiro, e só a encontrava sob o manto negro da escuridão. Dentre outras coisas, como não poder usar minissaia, calças jeans cintura baixa, decote profundo, batom, frequentar baile funk na Vila Andrade, conversar por internet ou telefone com as amigas, posar nua para Rafael – a exceção era para Michelangelo – e, principalmente, sair com amigos do sexo masculino, ela jamais deveria tentar vê-lo. Era pro-i-bi-do! E assim tudo transcorria na mais plena felicidade.
Ocorre que as ambiciosas irmãs de Psique, já devidamente instaladas em luxuosos apartamentos funcionais pagos com dinheiro do contribuinte, incentivadas pela mídia televisiva, começaram a encher o saco de Psique, insinuando que o tão misterioso amado era um monstro horrendo, que tinha chifres, calçava 52 e que quando ela menos esperasse ele iria comê-la. Além disso, insinuaram que ele ouvia Restart, Lady Gaga e Luan Santana, acabara de comprar a biografia de Justin Bieber e costumava assistir ao Domingão do Faustão. Foi a gota d’água.
Certa noite, Psique caminhou sorrateiramente até a alcova sagrada, decidida a descobrir a real identidade do seu amado. Empunhando uma facapeixeira (deveria ser assim pelas novas regras do Acordo Ortográfico) numa mão e uma vela preta de sete dias na outra, inclinou-se para mirar o rosto adorado e… “Ohhh…!!! jungle people, we are happy people!” – exclamou, tal foi a sua surpresa quando viu, placidamente adormecido com toda aquela candura e beleza em abundância, o Brad Pitt. Em carne, caras, bocas e sem a Angelina. Nesse exato momento uma bala perdida penetrou pela janela da cobertura, alojando-se no travesseiro esquerdo. Ou teria sido no direito? Indignado, ele exclamou: “PQP, esse travesseiro é de pena de ganso e me custou uma nota verde…” E, voando, desapareceu para sempre*.
Psique ficou inconsolável e, para punir as irmãs fuxiqueiras, usou todo o lobby possível na elaboração de um Projeto de Lei contra o nepotismo, propondo proibir a contratação de parentes nos órgãos públicos dos três poderes, alguns deles podres, o que acarretaria o fim do império de Niemeyer, transformando-o num deserto.
Decidida a recuperar a confiança de Eros, Psique o procurou dia e noite. Fez uma ronda por todos os bares da Avenida São João, juntamente com Maria Betânia, e nem sinal dele. Desesperada, comprou uma bolsa Louis Vuitton e foi pedir misericórdia à sogra, que de pronto aceitou o presentinho e, embora sabendo seu paradeiro, impôs algumas condições para trazer o filho de volta aos braços da nora. Afinal, ele estava internado numa clínica para menores infratores, atravessando sérios problemas psicológicos, pois não se conformava em haver sido queimado no ombro esquerdo – ou seria no direito? – com um pingo de óleo do rosa mosqueta. Uiii!
Assim sendo, não havia outro jeito. Psique teria que cumprir as quatro tarefas impostas por Afrodite:
A primeira e a mais difícil de todas era fazer com que o ex-Presidente Lula parasse de falar por metáforas e, como a própria Afrodite sabia tratar-se de perda de tempo, dado o grau de dificuldade, sem mais delongas pulou logo para o desafio seguinte.
A segunda consistia em conseguir identificar e separar todos os grãos de granola de uma tigela de açaí na tijela, inclusive especificando o tipo de banana usada no preparo, antes que a negra bomba energética concentrada se espalhasse como hábito alimentar pelo resto do mundo. Foi moleza. Uma amiga que gostava muito da banda Calypso, comovida com a tristeza da jovem, resolveu o problema sem maiores dificuldades.
Para realizar a terceira tarefa, Psique deveria ir até a Granja Solar e conseguir a maior quantidade possível de buchada de carneiro light que pudesse. As ovelhas, contrariando a contumaz subserviência, estupidez e alienação, a princípio se recusaram a deixar seus companheiros morrer pela causa, mas, doutrinadas por Napoleão e Bola de Neve, aliados dos humanos, e de alguns políticos inescrupulosos brasileiros que promovem a vergonhosa farra das aposentadorias vitalícias, ofereceram os couros às varas com relativa facilidade.


Na quarta tarefa, Psique teria que convencer Prometeu a devolver o fogo roubado dos deuses e resolver as pendências antigas da famigerada caixa de Pandora. Deveria então dirigir-se até Perséfone e trazer a tal Caixa que continha, dentre outras coisas, que iríamos saber posteriormente, um programa Photoshop pirata para retocar as fotos de Afrodite, que não podiam em hipótese alguma ser postadas no Orkut na forma original. Ela só teria que se desviar de um cachorro feroz de nome Scooby Doo e do seu amigo babaca chamado Salsicha. Ocorre que mais uma vez a pobre mortal se deixa levar pela curiosidade e abre a caixa. Ao invés da beleza, só o CD pirata, como já havíamos mencionado, uma fita do Senhor do Bonfim, um relógio ornado com strass comprado na 25 de Março, um disco duplo da Xuxa (Xuxa só para baixinhos/Xuxocão) e um vidro de Dramim B-6 que ela sorveu de um único trago, pensando tratar-se de absinto, e caiu num sono profundo, coitada, antes mesmo de o ônibus da Jardinense com destino a Caicó quebrar na ida (e na volta) próximo à entrada de Currais Novos.
Felizmente, Eros, que havia escapado da clínica, vem em seu socorro e mete rapidinho todo o sono dentro da caixa – bem lá no fundo -, deixando de fora só a esperança de Mário Quintana, uma meninazinha meiga que se atirara do décimo segundo andar de um prédio verde e ficara completamente louca.
Por fim, Zeus Júpiter (allegro ma non troppo), que no decorrer da Guerra de Troia tomou partido pelos gregos ou troianos, de acordo com os seus interesses pessoais, inclusive atendendo aos rogos carinhosos de Tétis para apadrinhar o mimado Aquiles, ou às constantes pressões incestuosas da esposa-irmã Hera, após consumir algumas caixas de viagra, consegue apaziguar Afrodite e esta permite a ratificação do casamento dos pombinhos – no civil e no religioso -, sendo conduzidos por Hermes, o fuxiqueiro-mor do Olimpo, até à Assembleia dos Deuses.


Olimpo, afresco, c.1850.
Luigi Sabatelli

Ali, após grandiosa farra regada a ambrosia, no devido tempo, quando o governo brasileiro ainda não tinha a menor ideia de como realizar as tão profundas e urgentes reformas fiscais, políticas e previdenciárias e as empresas de publicidade no país estavam longe de descobrir uma fórmula de produzir comerciais de dentifrícios menos idiotas, nasce um menino chamado Voluptas (Prazer!) e, até hoje, pasmem, ainda rola uma confusão com esse negócio de exame de DNA pra saber quem é o pai.


Fim

Nota

*Sempre – Unidade de medida de tempo usado antigamente na Grécia antiga, que equivale a “vou ali e volto já”.




Imagem: Pandora, de John William Waterhouse

Um comentário:

Vais disse...

Ei, Professor,
criatividade, imaginação, mil
Parabéns pra Inês
que prazer que deu de ler
Bom demais!
beijos