A bancada da jogatina
Observatório da Imprensa
De olho no noticiário mais ruidoso, o leitor vai sendo informado, ou desinformado, em pílulas e notas curtas, sobre iniciativas do Congresso Nacional que, da noite para o dia, podem surpreender sua rotina. A maioria da sociedade provavelmente ignora, por exemplo, que um projeto de liberação do jogo transita célere e sem restrições na Câmara dos Deputados. Apesar de o presidente da República ter declarado mais de uma vez ser contra a permissão para funcionamento de bingos e máquinas de jogo, não se conhece o pensamento de sua sucessora sobre a questão.
Enquanto isso, segundo a Folha de S.Paulo noticiou na quarta-feira (1/12), a bancada governista na Câmara apresenta proposta para votar, ainda este ano, projeto que legaliza os jogos de azar. O parlamentar mais empenhado em fazer passar a lei é o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), o que escancara uma contradição entre a bancada e o presidente da República.
De acordo com o jornal paulista, os outros partidos aceitariam aprovar projetos de interesse dos estados, como a Lei Kandir e a emenda constitucional do fundo da pobreza, em troca da liberação do jogo.
Longe da sociedade
Os defensores da abertura dos bingos, entre os quais se destacam representantes dos partidos menores e ideologicamente pouco definidos, como o PDT e o PTB, usam o velho argumento de que a reabertura dos bingos poderá gerar 250 mil empregos diretos e indiretos em todo o país, e uma arrecadação anual de impostos de R$ 7 bilhões.
Não custa lembrar uma frase do economista Ignacy Sachs: "Um dos esportes prediletos dos brasileiros é chutar indicadores de geração indireta de empregos".
Quanto à arrecadação de impostos, é para rir, dada a natureza de tais "empreendedores". Também é conveniente considerar que outras atividades criminosas ou de contravenção, como o tráfico de drogas e a exploração da prostituição, geram muitos empregos diretos e indiretos.
Só de seguranças armados e fogueteiros, encarregados de alertar sobre a chegada da polícia, o narcotráfico tinha mais de mil "empregados" diretos no Complexo do Alemão, fora os empregos indiretos que sempre gerou, até mesmo em países vizinhos.
O apressamento na votação do projeto de abertura dos bingos, patrocinada pelo líder do governo na Câmara, é claramente uma forma de fazer passar uma decisão legislativa longe da opinião pública, o que pode acontecer somente porque a imprensa está olhando para outro lado.
A guerra sem tiros
Na edição de quinta-feira (2/12), o Estado de S.Paulo informa, também em nota curta, que a Polícia Federal prendeu uma quadrilha que explorava vinte mil máquinas caça-níqueis na Bahia. O faturamento do grupo, segundo a polícia, chegava a R$ 50 milhões por ano.
Há menos de dois meses a polícia paulista prendeu, e depois liberou, um suposto empresário, em cujo nome havia dezenas de postos de gasolina, também envolvido com jogo clandestino, acusado de aplicar dinheiro da organização criminosa chamada Primeiro Comando da Capital. O acusado circula livremente e toca seus "negócios" na área de Taboão da Serra e Embu, região metropolitana de São Paulo, onde se sabe que tem sócios, entre eles vereadores e outras autoridades.O "empresário" foi candidato a deputado federal nas últimas eleições.
Esse cenário de negócios obscuros que escondem a lavagem de dinheiro do crime mais pesado tem fortes relações com o negócio do jogo, que o deputado Vaccarezza pretende legalizar.
Não foram poucas as famílias vitimadas pelo vício, estimulado pela profusão de máquinas que havia em bares da periferia das grandes cidades, no período em que o bingo eletrônico funcionou livremente.
Os "empresários" do setor costumam instalar em seus equipamentos chips programados para roubar os apostadores. Além disso, usam a estratégia de colocar apostadores profissionais, que em determinados momentos do dia "ganham" algum dinheiro numa das máquinas, criando a ilusão de que tudo depende da sorte.
A legalização de tais negócios certamente vai facilitar a lavagem de dinheiro ilegal, o que inclui o "caixa 2" de campanhas eleitorais. Nunca se comprovou para onde vai o lucro da jogatina, mas sempre houve indícios de que esse tipo de empreendimento tem forte relação com outras atividades criminosas, entre as quais o financiamento do narcotráfico.
O estudo das atividades da máfia italiana, durante a operação "Mãos Limpas", revelou essa conexão, que certamente se reproduz no Brasil, segundo o desembargador aposentado Walter Maierovitch, um dos maiores especialistas do mundo na investigação do crime organizado.
Os defensores do jogo voltam à carga no Congresso Nacional, sempre munidos dos mais nobres argumentos, sob o olhar distraído da imprensa. O conflito nas favelas do Rio faz muito barulho, mas a notícia mais importante sobre a luta da sociedade contra o crime organizado talvez esteja em Brasília.
4 comentários:
O que espanta é que as modalidades de crime e as oportunidades de fazer muita grana através dessas atividades são tantas, que nunca vai haver polícia que dê jeito. Caraca, brasileiro é mesmo chegado a uma ilicitude (gostou?) :)
Beijo, Marcelo.
Aprovar esse tipo de lei é deixa o crime organizado ser a vítima e todo trabalho da polícia será trocado por extorsões, assassinatos e outros crimes. Aqui no Rj já vimos o que os bicheiros são capazes de fazer...Agora com uma concorrência maior ainda?!
Adê e Pardal, o problema do jogo (e nem vou falar do vício que, em muitos casos dilacera a família) é o que está por trás dele: bicheiros = bandidos.
Quem conseguir provar que por trás das grandes casas de jogos (las vegas ou onde exista) não tiver um mafioso como sócio... Quem conseguir...
Oi, Marcelo. Minha família sofreu na pele as conseguências de ter um membro viciado em jogo. Na minha opinião, a legalização dos jogos é mais um departamento do grande circo oferecido à população . O pão já recebemos ( em conta gotas ).
Beijo, meu lindo.
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