segunda-feira, 9 de abril de 2007

Minha mídia

Já estamos no sábado e tenho a nítida e incômoda impressão de que este ano vai voar sem, entretanto, alcançar às alturas da igualdade tão sonhada. Sou daqueles que reserva sempre um sorriso para àqueles que ousam sonhar em asfalto tão medíocre, que ainda têm a coragem de acreditar na luz humana, mesmo que tudo leve à lógica do "apagão". Posso estar triste, amputado, mas sou incapaz de assistir complacente a tristeza alheia sem correr com alguma seringa de motivação.
Vou para casa já tarde, acompanho um amigo à casa de seus pais e, no caminho, a discussão é sobre o mundo de uma maneira geral (se é que podemos nos permitir tal heresia). Meu amigo é um otimista e um místico daqueles que instigam a gente a acreditar no possível; quer entrar para a política e fico imaginando alguém falar sobre "possibilidades possíveis que não dão votos" dentro de um partido político sem ser cortado ou tomar um tapinha nas costas do tipo "vai à merda". Falamos sobre o papel dos bons jornais e, dia seguinte, apesar dos chopes bebidos, resolvo não mudar a minha rotina por causa de uma dor de cabeça: compro a Folha de S. Paulo e espero o motoqueiro arremessar meu Jornal do Brasil.
Estendo-nos (eu, café, jornais) ao chão da sala, mas o café e os jornais parecem-me "exagerados na medida certa". O café, as notícias e minha ressaca são igualmente pretas, como tudo no Brasil ultimamente.
Sistema carcerário, extermínio de cidadãos por policiais (?), milícias, corrupção em larga escala, prostituição infantil... Por onde eu começo? Por nenhum lugar, o beco é sem luz no fim dos escombros (já que o túnel desabou por ter sido construído pelo Sérgio Naya).
Ligo a TV e o Show de Truman vai começar! Começo a perceber que os participantes desses "shows de realidade" (?) nunca me dizem nada exatamente porque não são humanos, são projetos daquilo que muitos querem que eu acredite ser a "realidade", são modelos de plástico (silicone?) mostrados na vitrine em frente aos nossos sofás; são a estética pós-modernista do que precisamos ser, pensar e vestir, ou seja, são tudo aquilo que não podemos nos espelhar se ainda quisermos pensar. Herói, mocinho, bandido, vilão... Existe um ser humano na face desta tão amada e destruída Terra que seja só mocinho ou só vilão?
Existe alguém, com todas as características terráqueas que, se bonzinho, nem fala palavrão, mas, se maléfico, não consegue dizer uma palavra gentil? Se as características pseudo-psicológicas de padaria da TV, além dos seus castos exemplos filosóficos de botequim, revelam a realidade, certamente sou alienígena!
Ao lidar e veicular (principalmente via TV, pois veículo de massa) temas tão complexos de modo tão superficial, o que posso esperar é uma incompleta interpretação dos assuntos abordados ou a perigosa deturpação dos temas. O que se quer para a sociedade? Monstrinhos sarados fisicamente e atrofiados mentalmente? Alguém que não consiga sustentar uma tese por exatos cinco minutos? Estou de ressaca porque o mundo anda muito bêbado?
Desisto de tentar entender certas coisas e mudo de mídia (ou continuo de certa forma nela) e vejo-me na internet – lugar onde só existem pessoas bonitas, brancas, abdômen definido, classe média alta – sem saber o que fazer depois de checar a minha caixa de e-mail. O mundo da internet possui um grande potencial para o deslumbramento do Ego, a supervalorização do que gostamos, mas não revelamos enquanto seres reais. A virtualidade, ao me deixar no anonimato, realiza o trabalho de lavagem egocêntrica perfeita. Os humanos continuam demasiadamente humanos.
Aqui entra o paradoxo do texto e a falta de coerência necessária para uma boa reflexão: o parágrafo quarto e o parágrafo sexto se negam? Há paradoxismo no que está exposto? O que é o homem? Somos vítimas da nossa própria fragilidade ética? Estamos ou somos corruptos?
Meu amigo dormiu e sonhou com as "possibilidades do possível", enquanto eu definhei nas divagações que sequer podem ajudar meu vizinho, meu irmão, minha sociedade. A reflexão precisa possuir luz, senão será apenas um meio de fuga, uma válvula de escape. Prefiro conversar com aquele que tenta, ébrio de discursos prudentes a ter que encarar mais uma sobriedade uniforme dos ditadores da moda ou da política social de mentirinha.
Quero poder escolher meu canal (começo da igualdade) e sintonizar meu cérebro no mundo (recuperação do vôo). Quero poder, inclusive, ter a liberdade de escrever com incoerência. Se bebi, que seja no rio de Platão, e se der ressaca, que seja a primeira de milhões.

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