por Roy Frenkiel
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Já demorava algum tempo, surpreendentemente, desde que despertamos pela última vez a ouvir as notícias tenebrosas à televisão: Mais um atentado terrorista devasta uma cidade estrangeira. Conforme afirma o prefeito de Moscow, Yuri M. Luzhkov, há evidências imediatas que indiquem que as supostas irmãs gêmeas suicídas sejam do norte do Cáucaso, rebeldes chechenas, região problemática para a Rússia e que já gerou escandâlos internacionais e conflitos fronteiriços na era de Vladimir Putin. No dia 3 de Setembro de 2004, rebeldes chechenos invadiram uma escola em Beslan, na Ossétia do Norte, matando mais de 300 pessoas, majoritariamente crianças. Os ataques por grupos chechenos clamando independência total do julgo da Rússia e a desocupação de seus territórios pela tropas do país não são raros, e os motivos dos conflitos estão longe de uma resolução satisfatória para ambos lados.
Há duas perspectivas vigentes quando o assunto é terrorismo. A primeira, por Robert A. Pape, busca comprovar em base de dados colhidos a partir de 1980 que a maioria dos terroristas não são extremistas religiosamente; não são jovens ignorantes cuja mente pode ser “lavada” facilmente por figuras influentes em suas respectivas comunidades; não foram diagnosticados, e não apresentam sinais de transtornos mentais; foram geralmente educados a nível superior ou técnico antes de aderirem a grupos terroristas; e que a intenção principal (ou, segundo Pape, o valor estratégico) dos atentados suicídas é muito mais cultural, sócio-econômica e geo-política do que religiosa. Marc Sageman não discorda das características e personalidades acima citadas (em níveis na casa dos 50-60% dos pesquisados), mas conclui que a religião tem sim um papel essencial e providencia uma base transcendental à justificativa e ao valor pessoal percebido em ataques suicídas.
Segundo Pape*, analista de relações externas norte-americano baseando-se em uma pesquisa estimulada pelos acontecimentos inesquecíveis do 11 de Setembro de 2001 em Nova York, o crescimento do terrorismo pode ser atribuído ao fato de que “atentados moderados produzem concessões moderadas”. Para Pape a atividade desses grupos tem um objetivo comum: Combater a ocupação imperial (na maior parte dos casos física, como no caso de tropas russas ocupando a Chechênia ou tropas israelenses ocupando a Faixa de Gaza ou a Cisjordânia), e retomar o senso nacionalista que unifica povos através de uma identidade cultural e étnica comum em fronteiras delineadas.
Assim, Pape traça alguns exemplos históricos de concessões que, segundo evidências um tanto quanto obscuras (e Pape admite isso, de certo modo), parecem coincidir com uma série de atentados terroristas. Hamas, por exemplo, pressionou Israel a desocupar a Faixa de Gaza enquanto já havia assinado o Acordo de Oslo com a Organização para Libertação da Palestina de Yasser Arafat. A intenção, segundo oficiais do Hamas, era levar a cabo cinco ataques terroristas no cerne israelense, mas apenas dois foram necessários. Apesar do acordo, Israel havia ignorado os dois prazos úteis para a desocupação e, Pape conclui, após os dois ataques, a retirada militar ocorreu. Para Pape, o aumento não só do número de atentados, mas de sua natureza violenta advém de pequenos, mas significantes sucessos das causas dos variados e ultra segmentados grupos terroristas. A maior falha estratégica desses ataques passa pelo excesso de choque. Pape diz que “atentados extremos não parecem findar em concessões.”
Sageman procura comprovar que a maioria das concessões citadas não foram nem duradouras nem atribuíveis aos ataques mencionados. Israel ainda voltou a ocupar a Faixa de Gaza na segunda intifada, fato que Sageman usa para fomentar sua conclusão de que ataques suicídas não são necessariamente baseados em um senso estratégico concreto, nem baseados em concessões que para o psiquiatra criminal simplesmente não ocorrem.
O limite que Pape delinea serve para aumentar a necessidade de encontrar qualquer motivo para justificar, empiricamente, o motivo de grupos que atuam em violência extrema - que de todos os modos não surte o efeito esperado. A religião, alinhada a um senso histórico, étnico e cultural providenciam os ingredientes prediletos para quem recruta seus soldados terroristas. A religião em si, explica Sageman, não garante nem justifica a violência e a ética por trás da necessidade da mesma em cada situação, mas alinhada a um senso de violência cultural e histórica, encaixa-se como uma luva na equação, somando legitimidade aos atos mais calamitosos. O budismo, por exemplo, não tendo em sua história uma saga de reação budista violenta como os hindus e os Sikhs ou muçulmanos e judeus (o primeiro grupo terrorista estudado por Pape foi judaico), não vê atos de extrema violência feitos em seu nome.
Rebeldes chechenos também encontram alguma identidade (sunitas muçulmanos) que os separe essencialmente dos vizinhos russos (cristãos ou totalmente seculares), mas a causa, como a causa Palestina, a causa de Sikhs contra Hindus e dos judeus terroristas que formavam um grupo clandestino opondo-se à ocupação de Jerusalém pelo Império Romano, parece realmente ser muto mais pragmática do que meramente religiosa. No entanto, ignorar a religião não como a causa principal de ataques suicídas, mas como um fator importante na fomentação de atitudes violentas minoritárias seria um “grande pecado”. Apesar da dificuldade de encontrarmos causa mesmo encontrando muitas relações entre fatores históricos e análises políticas, é óbvio que a religião contribui para a legitimação do terrorismo islâmico, mas é mais óbvio (só não tão falado) que a maior parte dos seguidores desta religião não são terroristas.
Ainda assim, conforme disse Scott Atran, especialista no Oriente Médio a uma classe de estudantes universitários, talvez seja “olhando para o Leste” que o Oeste começará a vencer o terrorismo. Talvez meramente enxergar seus pedidos, seus dilemas e suas causas já seja o suficiente para amenizar a violência. A diminuição da violência, em outras palavras, geraria paz. Paz gerando paz, e não o oposto. Infelizmente, por enquanto só nos resta ouvir as quarenta badaladas das vítimas russas na manhã de Março.
* A Lógica Estratégica dos Ataques Suicídas
** Entrevista de Marc Sageman para a New American Foundatio
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