As revoltas ou revoluções nos países árabes têm ocupado as atenções do noticiário internacional desde o início do ano. Justo, pois, embora ainda seja cedo para fazer grandes previsões, já se pode falar que se trata de uma mudança radical e histórica. Em geral, são regimes opressores, regidos por ditadores que deixaram os anseios de seus povos de lado e se conformaram com o poder corrupto e desleal, por muitos anos.
No entanto, para quem não segue muito de perto a política local, a tentação de jogar todos estes países no mesmo saco é enorme e o tratamento da mídia, na maioria dos casos, não ajuda a distinção. Cada caso é um caso e tem suas particularidades. Cada nação tem uma história, formação específica e circunstâncias próprias que resistem ao impulso generalista de tratar essas nações como “o mundo islâmico” ou “os países árabes”.
A Tunísia tem uma classe média bem formada, muito contato com o turismo europeu. O Egito tem um Exército poderoso que, ao perceber o clamor popular e a incompatibilidade da rua com o regime de Hosni Mubarak, dispensou o ditador. O Iêmen, com instituições fracas, é outra história. A Arábia Saudita, monarquia absolutista, outra ainda. A Líbia, a bola da vez, também tem fatores bem específicos que tornam a revoltasingular.
O país é dividido em tribos, e, depois de 42 anos de uma liderança personalista e delirante de Muamar Kadafi, a coesão social é precária e as instituições são piores ainda. No caso de uma vitória da oposição, a transição, portanto, seria complexa. Kadafi conta com apoio de parte considerável da população (não se sabe ao certo quanto). No caso de uma vitória militar das forças leais ao ditador, a repressão aos opositores rebeldes, certamente, será implacável. E vai deixar um sentimento amargo para boa parte da população insatisfeita. Ou seja, vai ser ruim para o país – e para o povo líbio –de qualquer maneira.
A situação externa não é menos complexa. As potências ocidentais – quem mais se pronuncia a respeito e tem condições de agir –, estão alarmadas. Condenam os bombardeios contra civis, ameaçam intervir militarmente e já impuseram sanções que, como quase sempre, são pouco produtivas.
Até o momento, a chamada comunidade internacional tomou algumas resoluções e medidas:
1 – O Conselho de Segurança das Nações Unidas, órgão multilateral que tem poder de determinar uma possível intervenção e sancionar com respaldo geral, aprovou uma resolução que embarga a venda de armas e determina o congelamento de bens da Líbia no exterior. A ação foi reforçada pela Interpol. E condenou, o que é só retórica, mas passível de se tornar resolução mais de fato adiante.
2 – O Conselho de Direitos Humanos da ONU abriu investigação sobre Kadafi no Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade e suspendeu o país do órgão.
3 – Vários países 1 2 impuseram o congelamento de bens, fundos e ampliaram as restrições econômicas além das impostas pela ONU. A Rússia parou de vender armas a Kadafi.
4 – Os Estados Unidos, a Grã-Bretanha, a França, o Canadá e a Itália deslocaram navios de guerra para o Mar Mediterrâneo próximos à costa libanesa.
Paralelamente, a diplomacia correu solta, sem, até agora, chegar a uma solução concreta. A ação direta mais falada é a de impor uma área de exclusão aérea, para evitar que as forças de Kadafi continuem bombardeando os rebeldes e os civis. O debate não é de simples conclusão e tem implicações jurídicas, além de uma difícil costura política..
França e Grã-Bretanha apóiam a medida. Os EUA titubeiam em tomar uma decisão sem apoio mais amplo, já que passou por cima de todos os procedimentos regulares ao invadir o Iraque baseado em mentiras e deu no que deu. Washington fala em decisão na ONU, via Conselho de Segurança, o que é o procedimento correto legalmente. O Brasil insiste nessa via, cumprindo a tradição do Itamaraty de uma abordagem multilateralista. No entanto, o Conselho de Segurança conta com a resoluta oposição da China e da Rússia, ambos com poder de veto. Na Otan, enfrenta resistência da Alemanha e da Turquia.
A ação militar tem sérias implicações. Para instituir uma zona de exclusão aérea, que autoriza o abate de aviões líbios na região determinada, será necessário um bombardeio para anular as defesas anti-aéreas de Kadafi. E elas são consideráveis e, pior, estão em regiões densamente povoadas por civis. Os EUA já cogitaram ajuda militar aos rebeldes, sem muito alarde, via Arábia Saudita. Rumores falam de ajuda egípcia. Mas, a ofensiva dos últimos dias virou o jogo a favor de Kadafi. E aí?
Um comentário:
Grande, o Pablo vale a pena mesmo ler. Jornalista do Estado de Minas em BH, gente boissima.
abrax
RF
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